segunda-feira, 12 de abril de 2010

A INFORMALIDADE DAS MUTAÇÕES CONSTITUCIONAIS E SEUS REFLEXOS NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 01

Capítulo I - CONSIDERAÇÕES ACERCA DE DIREITO CONSTITUCIONAL PODER CONSTITUINTE E CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE 03
1.1 Conceito de Constituição 03
1.2 Espécies de Constituição 05
1.3 Poder Constituinte 06
1.4 Controle de Constitucionalidade 10

Capítulo II – MUTAÇÕES CONSTITUCIONAIS 16
2.1 Conceito de Mutação Constitucional 16
2.2 Características e pressupostos das Mutações Constitucionais 19
2.3 Limites das Mutações Constitucionais 22

Capítulo III – MODALIDADES DE MUTAÇÕES CONSTITUCIONAIS 26
3.1 Considerações acerca de interpretação constitucional 26
3.2 Mutações por interpretação constitucional 31
3.3 Mutações pelos costumes constitucionais 35

Capítulo IV – INCIDÊNCIAS DAS MUTAÇÕES CONSTITUCIONAIS NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO 37
4.1 Exemplos na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 39
4.2 O Supremo Tribunal Federal e as Mutações Constitucionais 43
4.3 Mutações Inconstitucionais 45

CONCLUSÃO 48
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 53



INTRODUÇÃO

Para escolher o tema da presente monografia o pensamento teve de vagar pelos diversos ramos da grande árvore denominada direito, então, encontrou porto em um ramo fundamental, denominado Direito Constitucional, esse ramo possui uma folha cujo nome é mutação constitucional, ela deu origem ao tema a informalidade das mutações constitucionais e seus reflexos no ordenamento jurídico brasileiro.
O objeto do presente estudo tem como cerne o mecanismo de alteração informal das constituições, denominado “mutação constitucional”, enforcará os reflexos que tal fenômeno ocasiona no ordenamento jurídico brasileiro, demonstrará a importância de sua ocorrência ante a evolução da sociedade, desde que, seja aplicado de forma responsável, gerando evolução acompanhada de justiça.
Uadi Lammêgo Bulos conceitua mutação constitucional como processo informal de mudança da Constituição, por meio da qual são atribuídos novos sentidos, conteúdos até então não ressaltados à letra da Constituição, quer através da interpretação, em suas diversas modalidades e métodos, quer por intermédio da construção, bem como dos usos e dos costumes constitucionais, ressalta ainda, que as mudanças informais são difusas e desorganizadas, porque nascem da necessidade de adaptação dos preceitos constitucionais aos fatos concretos, de um modo implícito, espontâneo, quase imperceptível, sem seguir formalidades legais.
Pode-se extrair dos entendimentos doutrinários que as Constituições são modificadas informalmente em seu significado por mecanismos diversos dos formais (revisão e emenda). Os meios tradicionais são valiosos arcabouços, contudo a sociedade, que é dinâmica, necessita de mudanças que operem na velocidade de sua evolução, o que justifica a aplicação de mutações.
O elemento dinâmico é essencial para a ocorrência das mudanças informais nas constituições, que diferem dos processos formais por não possuírem os requisitos determinados pelo legislador constituinte.
A mutação constitucional processa-se de modo imperceptível. É identificada mediante exame comparativo do entendimento conferido ao mesmo texto constitucional, aplicado em épocas distintas, em momentos cronologicamente afastados entre si.
A efetividade das normas constitucionais deve ser buscada através da correlação com a realidade social, para tanto se faz necessário o reconhecimento de mecanismos aptos a preservar a abertura do sistema, possibilitando a consonância das normas com a realidade social.
Com a ocorrência das mutações Constitucionais, os sentidos das normas são aplicados concomitantemente a realidade social, tornando as já existentes plenamente eficazes, por intermédio interpretativo. Evita-se assim, processos demasiadamente longos para alteração da Constituição, fato benéfico à sociedade que modifica seu pensamento constantemente, não podendo a ciência jurídica isolar-se do corpo social, sempre deve haver troca de energia entre o direito e tal corpo.
Seria ilógico o divórcio entre normas constitucionais e sociedade, assim o prudente é que sejam realizadas mutações constitucionais, celebrando desta forma, o casamento entre tais personagens.
Esta monografia pode ser classificada quanto aos procedimentos, como pesquisa bibliográfica, uma vez que abarcará a bibliografia relativa à mutação constitucional, visando à compreensão dos problemas retratados nas questões norteadoras sob um prisma teórico.
A base da pesquisa bibliográfica está estruturada na análise a ser realizada em livros, artigos, jurisprudências, pareceres e legislação pertinente.
A pesquisa foi realizada dentro de uma perspectiva de abordagem qualitativa, já que foi desenvolvida por intermédio de pesquisa bibliográfica e de observações do exercício profissional do Supremo Tribunal Federal.
A observação será feita de forma interativa com objetivo de gerar informações detalhadas e que completem e ampliem a coleta e a compreensão dos dados.









Capítulo I - CONSIDERAÇÕES ACERCA DE DIREITO CONSTITUCIONAL PODER CONSTITUINTE E CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE

1.1 – Conceito de Constituição

O conceito de Constituição tal como é aceito hodiernamente foi delineado no contexto das Revoluções Burguesas do final do século XVIII, como forma de reação ao absolutismo monárquico, os Estados decidiram adotar Leis fundamentais ou Cartas Constitucionais, reunindo sua organização política e a declaração de direitos dos indivíduos num documento escrito, intitulado Constituição; no entanto, desde a antiguidade verifica-se a idéia de um conjunto de normas ou lei superiores versando acerca da organização política da sociedade (KUBLISCKAS , 2009, p.178).
O primeiro povo a praticar o constitucionalismo, por exemplo, foi o povo hebreu, já o enxergava como movimento de organização do Estado que criava limites ao poder político através da denominada lei do senhor, competindo aos profetas punir os atos dos governantes que exorbitassem os limites bíblicos (LOEWENSTEIN, 1965, p.154).

Cabe apontar que a doutrina do contrato social, desenvolvida nos séculos XVI, XVII e XVIII por autores como Thomas Hobbes, Jean Bodin, John Locke e Jean Jacques Rousseau, respeitadas as divergências autorais, tinha como ponto de convergência a idéia de que a sociedade deveria ser entendida como uma organização baseada num contrato entre todos os homens, logo, conclui-se que a referida doutrina foi precursora direta do movimento intitulado Constitucionalismo Moderno.
Desta forma, conforme sintetiza Sérgio Resende de Barros:

Muitas manifestações houve na prática e na teoria do direito político, desde a antiguidade, colocando as leis fundamentais da organização política em um plano superior ao das leis ordinárias. Mas, em nenhum momento histórico, até a idade moderna, cogitou-se de serem tais normas superiores produzidas por um poder especialmente destinado a constituir a sociedade política, mesmo porque eram normas naturalmente costumeiras ou ideologicamente tidas como de origem sobrenatural. Somente no despontar de uma nova era, a contemporânea, é que veio a surgir a idéia de Poder Constituinte, porque só então se teve necessidade histórica de pensá-la, a fim de viabilizar a atuação da ideologia que vinha para regenerar o Estado, superando a velha ideologia absolutista”.


Nas precisas lições de Alexandre de Moraes encontramos um conceito, lato sensu, de Constituição
È o ato de constituir, de estabelecer, de firmar; ou, ainda, o modelo pelo qual se constitui uma coisa, um ser vivo, um grupo de pessoas; organização, formação. Juridicamente, porém, Constituição deve ser entendida como a lei fundamental e suprema de um Estado, que contém normas referentes à estruturação do Estado, à formação dos poderes públicos, forma de governo e aquisição do poder de governar, distribuição de competências, direitos, garantias e deveres dos cidadãos. Além disso, é a Constituição que individualiza os órgãos competentes para a edição de normas jurídicas, legislativas e administrativas (2005, p.2).

Segundo o autor supracitado, é importante destacar o conceito ideal de Constituição, imposto a partir do movimento constitucional no início do século XIX, que é identificado principalmente com os postulados político-liberais, considerando-os como elementos matérias caracterizadores e distintivos os seguintes: (a) a Constituição deve consagrar um sistema de garantias da liberdade (essa essencialmente concebida no sentido do reconhecimento de direitos individuais e da participação dos cidadãos nos atos do poder legislativo através do parlamento); (b) a constituição contém o princípio da divisão de poderes, no sentido de garantia orgânica contra abusos dos poderes estaduais; (c) a constituição deve ser escrita (documento escrito).
Para Michel Temer (2004, p.16) a Constituição se define como “o corpo”, a “estrutura” de um ser que se convencionou denominar Estado. Pois nela visualizamos as partes componentes do mesmo, o que nos autoriza a afirmar que somente pelo seu exame poderemos conhecê-lo. O referido autor traz em sua obra a seguinte indagação: O que seria Estado? Respondendo logo em seguida sua própria indagação: “Estado é a sociedade soberana, surgida com a ordenação jurídica, cuja finalidade é regular globalmente as relações sociais de determinado povo fixo em dado território sob um poder”.
Para Temer a Constituição possui três sentidos: político, jurídico e sociológico. Faremos a análise de cada um deles, enfatizando que o sentido sociológico integra fundamentalmente o tema da presente monografia.
O sentido político, Michel remonta as idéias de Carl Schimitt para descrever o sentido político da Constituição, para Schimitt (apud TEMER, p.18). há diferença entre a Constituição e a lei constitucional. A Constituição seria a decisão concreta de um conjunto sobre o modo e forma de existência da unidade política, onde se verificaria a manifestação de um poder que decidiria acerca da forma de ser do Estado, de seus alicerces, de sua estrutura básica, de sua conformação fundamental. Tudo como fruto da decisão política tomada em dado momento. Assim, seria conteúdo próprio da Constituição os que fossem relativos à forma de Estado, à de governo, aos órgãos do poder e à declaração dos direitos individuais. Na visão de Carl, tudo que não se enquadrasse no rol mencionado, ainda que inserido expressamente na Constituição, seria considerado como lei Constitucional, significa: O constituinte não precisaria tratar daquela matéria por não ser emanada necessariamente da decisão política fundamental.
Podemos vislumbrar a partir de tais idéias a classificação de constituições quanto ao conteúdo, que se subdivide em material e formal.
O sentido Jurídico, Temer busca apoio no pensamento de Hans Kelsen (apud TEMER, p.18). que para definir tal sentido ressalta a diferença entre o direito e as demais ciências, defendendo que o jurista não precisa socorrer-se da sociologia ou da política para sustentar a Constituição.
O sentido Sociológico, Ferdinand Lassalle aponta que teremos tal sentido refletido nas Constituições quando o pensamento social coadunar com o texto constitucional, sendo desta forma, legítima a Lei maior; do contrário, quando o pensamento social distar da lei maior, teremos uma Constituição ilegítima, o que nada mais será do que uma folha de papel (2001, p.15).
O último sentido exposto tem grande relevância para nossa pesquisa, eis que as mutações constitucionais ocorrem com o fim de igualar o pensamento social a nossa Constituição, o que veremos no capítulo seguinte.

1.2 – Espécies de Constituição

As Constituições podem ser classificadas quanto ao conteúdo (matérias ou formais), à forma (escritas não escritas), ao modo de elaboração (dogmáticas ou históricas), à origem (promulgadas ou outorgadas), à extensão e finalidade (analíticas ou sintéticas) e finalmente quanto à estabilidade (imutáveis, semi-rígidas, flexíveis e rígidas).
Cumpre para o bom entendimento de nossa pesquisa fazermos algumas considerações acerca da classificação relativa à estabilidade constitucional:
São denominadas imutáveis as constituições que não admitem alterações, tal imutabilidade poderá ser relativa, por exemplo, no caso das limitações temporais.
Nas Constituições semi-flexíveis ou semi-rígidas, algumas regras poderão ser alteradas pelo processo legislativo ordinário ao passo que outras, apenas pelo processo legislativo especial, bem mais dificultoso.
Constituições flexíveis são aquelas que poderão ser modificadas livremente pelo legislador ordinário.
As Constituições rígidas podem ser alteradas através de um processo legislativo solene e dificultoso, diferente das demais espécies normativas. A nossa constituição é classificada quanto a sua estabilidade como rígida, conforme preceitua Michel Temer

Revela essa rigidez o confronto do art.60 com o art.47 da CF. Aquele prevê processo especial para a criação de Emenda à Constituição. Exige: a) no tocante à iniciativa, mediante proposta de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do senado Federal; do Presidente da República; de mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros; b) no tocante à discussão e votação, será discutida e votada em cada casa do Congresso Nacional, em dois turnos; c) quanto ao quorum de votação, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, 3/5 dos votos dos respectivos membros.
È diferente o processo de elaboração da lei comum, previsto no art.47. Este preceitua que, “salvo disposição constitucional em contrário, as deliberações de cada casa e de suas Comissões serão tomadas por maioria dos votos, presente a maioria absoluta de seus membros”.
Por outro lado, a iniciativa de projeto de lei incumbe, dentre outros, a qualquer deputado ou senador, como preceitua o art.61.
Finalmente, a sua discussão e votação se fazem em um único turno de votação.
De tudo que se vê que é mais fácil dar início a um projeto de lei do que a um projeto de Emenda Constitucional. "È mais simples discutir e aprovar um projeto de norma em um turno de votação do que em dois turnos; é mais singelo obter a maioria simples para aprovação, a que alude o art.47, do que a maioria de 3/5 exigida para aprovação de Emenda à Constituição (2004, p.27).

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88) apresenta a seguinte classificação: formal, escrita, legal, dogmática, promulgada, rígida e analítica (MORAES, A., 2005, p.2).

1.3 – Poder Constituinte

Conforme entendimentos pacificados doutrinariamente, poder constituinte é conceituado como poder de produção das normas constitucionais, por meio do processo de elaboração e/ou reforma da constituição, com o fim de atribuir legitimidade ao ordenamento jurídico do Estado.
Guilherme Peña de Moraes aponta que a teoria do poder constituinte é esposada através da obra “Que é o terceiro Estado?” de autoria de Emmanuel Joseph Sieyés, através da qual eram manifestadas as reivindicações da burguesia contra o absolutismo, com o fim de legitimar e limitar o poder político inerente ao Estado. O referido autor detecta que a composição dos Estados gerais não permitiria a representação da nação, que era politicamente confundida com o terceiro Estado, pois o direito ao voto era exercido por ordem, com o intuito de beneficiar a nobreza e o clero, em detrimento da classe dos trabalhadores (2006, p.10).
A convocação da Assembléia Nacional Constituinte possibilitaria a restauração da legitimidade do poder político, eis que a Constituição seria promulgada pelos representantes da nação, estabelecendo uma nova ordem jurídica.
A natureza jurídica do poder constituinte é a de poder político, contudo, é asseverado por Guilherme Peña de Moraes que a doutrina não é unívoca neste sentido.
A titularidade do poder constituinte é conferida ao povo, já o seu exercício é conferido aos representantes do povo, é o que podemos depreender a partir da leitura do art.1º, parágrafo único da CRFB/88, logo, o titular do poder nem sempre será o seu exercente.
O exercício do poder constituinte é verificado por várias formas, exemplos: pela eleição de representantes populares que integram uma Assembléia Constituinte, pela revolução (quando um grupo exerce o poder sem manifestação direta da sociedade).
Na visão de Alexandre de Moraes o poder constituinte é dividido em duas espécies, a saber: poder constituinte originário e poder constituinte derivado, este último se subdivide em poder constituinte derivado reformador e poder constituinte derivado decorrente (2005, p.22/24).
Traremos o conceito de cada espécie deste grande gênero denominado poder constituinte, conferindo maior ênfase ao poder constituinte derivado reformador, que tem grande relevância para nossa pesquisa.
Poder constituinte originário é o poder de elaboração da Constituição da República, logo, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, promulgada pela Assembléia Nacional Constituinte, é fruto do poder constituinte originário, que têm como características a inicialidade (base da ordem jurídica), a ilimitação (não sofre limitações pelo ordenamento jurídico anterior), e o incondicionamento (não se sujeita a qualquer forma antecedente para externar sua vontade, não segue procedimentos determinados para realizar sua obra de constitucionalização).
O poder constituinte derivado está inserido no texto constitucional, decorre do poder constituinte originário, logo, conhece limitações constitucionais expressas e implícitas, sendo passível de controle de constitucionalidade. Têm como características: a derivação (sua força advêm do poder constituinte originário), a subordinação (é limitado pelo texto constitucional não podendo contrariar suas normas) e o condicionamento (seu exercício deve seguir as regras estabelecidas pelo texto da Constituição Federal).
O poder constituinte derivado, como anteriormente afirmado, é subdividido em derivado decorrente (possibilidade dos Estados-membros, em razão de sua autonomia político-administrativa, organizar suas próprias constituições estaduais, sempre seguindo os ditames da Constituição federal) e derivado reformador (tem a possibilidade de alterar o texto constitucional, obedecendo às normas impostas pela Constituição Federal).
O poder constituinte derivado reformador se materializa através de revisões e emendas constitucionais, a saber:
Revisões constitucionais - foi determinada na CRFB de 1988, que após cinco anos da data de sua promulgação, através de um processo extraordinário, por intermédio do Congresso Nacional, em sessão unicameral, seria realizada uma revisão constitucional (art.3º dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias), com o escopo de introduzir mudanças no texto constitucional, o que de fato se cumpriu entre os meses de outubro de 1993 e maio de 1994, contudo, em razão da ocorrência da denominada CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) do orçamento, concomitante com o processo revisional, bem como com as eleições presidenciais; o processo de revisão ficou esvaziado e culminou com a promulgação de apenas seis emendas constitucionais de revisão.
Com base em entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), hodiernamente é impossível um novo processo de revisão constitucional, deste modo, uma vez exaurido o processo de revisão constitucional em 1994 e acolhido o entendimento do guardião de nossa lei maior - STF, o único mecanismo formal disponível para introdução de mudanças na Constituição federal vigente é o procedimento de emenda constitucional (KUBLISCKAS, 2009, p.178).
A proposta de emenda constitucional é considerada ato infraconstitucional, pois apenas ingressa no ordenamento jurídico após a sua aprovação, passando neste momento a possuir a mesma hierarquia que as normas constitucionais originárias; as limitações existentes para sua ocorrência estão inseridas no art.60 da CRFB/88, porém se qualquer das limitações impostas deixarem de ser observadas será considerada inconstitucional; conclui-se que as emendas são passíveis do controle de constitucionalidade, tanto difuso, quanto concentrado.
As limitações expressas do poder constituinte reformador encontram-se previstas em nossa lei maior e se subdividem em: circunstanciais (art.60, § 1º, CRFB/88), materiais (art.60, §4º, CRFB/88 “cláusulas pétreas”) e procedimentais ou formais (art.60, I, II, II, §§ 2º, 3º e 5º, CRFB/88, relativas ao processo legislativo).
Concernente às limitações implícitas do poder constituinte reformador Michel Temer preconiza
São implícitas as vedações atinentes à supressão do próprio artigo que impõe expressamente aquelas proibições. Não teria sentido emenda que suprimisse o disposto no §4º do art.60 da CF. Outra vedação implícita é a impediente de reforma constitucional que reduza as competências dos Estados federados. Assim, não é permitido ao exercente da competência reformadora localizar competências residuais dos Estados e, por emenda aditiva, acrescentá-las às da União ou do Município, pois isto tende a abolir a Federação. È que, em dado instante, o texto constitucional, embora mantivesse intacta sua letra, estaria substancialmente modificado na medida em que os estados federados não tivessem nenhuma competência.
Também se veda, implicitamente, alteração constitucional que permita a perpetuidade de mandatos, dado que a temporariedade daqueles é assento do princípio republicano.
Finalmente, é proibição implícita aquela atinente ao procedimento de criação da norma constitucional, em nível derivado. Isto porque o constituinte estabeleceu procedimento rígido para reforma em grau determinado. "Não pode o órgão a quem se atribui a competência reformadora modificar o critério de rigidez estabelecido pelo legislador constituinte (2004, p.36).

Paulo Bonavides apresenta uma quarta espécie de limitação ao poder de reforma, intitulada limitação temporal, esta interdita a reforma ao texto constitucional por um determinado espaço de tempo, o que importa uma intangibilidade temporária da Constituição (1999, p.24).
Para Sérgio Resende de Barros pode ser visualizada limitação temporal através do art.3º dos ADCT da CRFB/88, que previu condição temporal positiva ao determinar a realização de revisão constitucional após cinco anos, contados da promulgação da Constituição, pelo voto da maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, em sessão unicameral.
A doutrina majoritária coaduna com entendimento descrito no parágrafo anterior, no entanto, para Wellington Márcio Kubliscas a Constituição brasileira de 1988 não sofreu limitação temporal, ainda que tenha estabelecido a obrigatoriedade da realização de uma revisão constitucional em cinco anos contados da data de sua promulgação (2009, p.60).
A existência de limites materiais ensejou o surgimento de algumas polêmicas, dentre elas, especificamente uma nos chamou atenção: A que indaga se poderiam as cláusulas pétreas serem amarradas de modo definitivo a geração futura?
A primeira corrente, defendida por autores como Duguit, Duverger e Vedel, refuta a inalterabilidade à medida que nega a distinção entre poder constituinte originário e derivado reformador, para os mesmos, observadas as peculiaridades, o povo tem o direito de rever suas posições, ainda que prejudiquem os princípios e pontos fundamentais anteriormente firmados.
A segunda corrente, defendida por autores como Carl Schimitt, Konrad Hesse, Gomes Canotilho, Paulo Bonavides, entre outros, defende a imutabilidade absoluta das cláusulas pétreas, onde a função do poder constituinte derivado reformador é a de apenas adaptar e corrigir o texto constitucional ante a evolução da sociedade e não alterá-lo, pois, se o fizesse restaria caracterizada fraude constitucional.
Finalmente, a terceira corrente, representada por autores como Biscaretti di Ruffia, Manoel Gonçalves Ferreira Filho, Gilmar Ferreira Mendes, e outros, defende uma imutabilidade relativa para as cláusulas pétreas; para os referidos doutrinadores, os limites materias podem ser quebrados mediante duas etapas, uma destinada a derrogar a norma proibitiva, e a outra com o propósito de instituir as reformas almejadas (FRANCISCO, 2003, p.7).
Através da explanação dos posicionamentos doutrinários acerca dos limites impostos ao poder constituinte derivado, verifica-se que é inegável sua importância, contudo, conforme salienta Kublisckas

Os limites ao poder reformador não podem ser um obstáculo intransponível para atualização e adaptação do texto constitucional às novas realidades da sociedade, em constante processo de mudança e evolução, sob pena de desvalorização da própria Constituição em seus aspectos fundamentais bem como do aumento do risco de rupturas institucionais (2009, p.75).


1.4 – Controle de constitucionalidade

A idéia de controle de constitucionalidade paira em torno da Supremacia da Constituição sobre todo o ordenamento jurídico e, também, à de rigidez constitucional e proteção dos direitos fundamentais.
Estando a Constituição no ápice da pirâmide normativa torna-se visível à supremacia e a rigidez constitucional, observando a norma superior, o legislador encontrará a forma de elaboração legislativa e desentranhará seu conteúdo.
O controle de constitucionalidade caracteriza-se como garantia de supremacia dos direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição, ele torna possível o processo democrático em um Estado de Direito.
Conforme as precisas lições de Alexandre de Moraes, controlar a constitucionalidade significa verificar a adequação de uma lei ou ato normativo com a Constituição, verificando os requisitos materiais e formais (2005, p.631).
A supremacia das normas constitucionais exige que na função hermenêutica de interpretação, seja dada preferência ao sentido que se amoldar à Constituição.
Deste modo, no caso de normas com várias interpretações possíveis, deverá ser concedida a que apresente conformidade com o texto constitucional, evitando inconstitucionalidades.
A inobservância das normas do processo legislativo constitucional (arts. 59 a 69, da CRFB/1988) gerará inconstitucionalidade formal, ao passo que a contrariedade de espécie normativa (conteúdo, no todo ou em parte) à Constituição gerará inconstitucionalidade material.
No Brasil a regra é que seja utilizado o controle de constitucionalidade judiciário, que tem por escopo verificar a compatibilidade de atos normativos com a Constituição, no entanto também é realizado o controle pelo executivo e pelo legislativo (MORAES, A., 2005, p.652).
Quanto ao momento de realização do referido controle, temos o controle preventivo que impede o ingresso no ordenamento jurídico de normas eivadas pela inconstitucionalidade e temos o controle repressivo, que busca expurgar do sistema a norma editada em desrespeito a Constituição.
Vislumbramos duas hipóteses de controle preventivo de constitucionalidade, todas têm o escopo de impedir que normas eivadas do vício de inconstitucionalidade adentrem no universo jurídico, a saber: comissões de constituição e justiça e o veto jurídico.
Através das comissões de constituição e justiça, é realizada a análise da compatibilidade do projeto de lei ou proposta de emenda constitucional apresentados com o texto constitucional, tal hipótese de controle, também poderá ser realizada pelo plenário da casa legislativa. O regimento interno do Senado prevê, no art.101, a existência de referida comissão, que deverá opinar sobre a constitucionalidade, juridicidade e regimentalidade das matérias que lhe forem submetidas por deliberação do plenário, por despacho do presidente, por consulta de qualquer comissão, ou quando em razão desses aspectos houver recurso de decisão terminativa de comissão para o plenário.
Veto jurídico, o Presidente da República poderá vetar o projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional por entendê-lo inconstitucional, é o que prevê o art.66§1º da CRFB/88, tal veto é denominado veto jurídico.
No Brasil, o controle de constitucionalidade repressivo é exercido pelo Poder Judiciário, tal controle é misto, eis que realizado de forma concentrada e difusa, é o que podemos visualizar pela leitura dos arts. 97 e 102, I, a, da CRFB/88 (respectivamente, controle realizado pelos tribunais - que pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder público – e controle realizado pelo Supremo Tribunal Federal – a quem compete à guarda da Constituição, cabendo-lhe, originariamente, processar e julgar a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual e a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal).
O controle difuso ou aberto, também conhecido como controle por via de exceção ou defesa, é caracterizado por possibilitar a todo juízo ou tribunal a analise no caso concreto da compatibilidade do ordenamento jurídico com o texto constitucional. Na via de exceção a manifestação do judiciário é feita sobre questão prévia, sendo indispensável ao julgamento do mérito.
O controle difuso é caracterizado por ser exercido apenas sobre casos concretos, os efeitos gerados retroagem para as partes envolvidas no processo, quando constatada inconstitucionalidade, no entanto poderá o reconhecimento da inconstitucionalidade ultrapassar a órbita do processo, ampliando os efeitos da declaração incidental de constitucionalidade pelo STF (art. 52, X, CRFB/88), quando então os efeitos se estenderão a todos, porém não retroagirão.




O controle concentrado ou via de ação direta foi criado por Hans Kelsen, que justificou a escolha de apenas um órgão para exercê-lo da seguinte forma
Se a Constituição conferisse a toda e qualquer pessoa competência para decidir esta questão, dificilmente poderia surgir uma lei que vinculasse os súditos do direito e os órgãos jurídicos. Devendo evitar-se tal situação, a Constituição apenas pode conferir competência para tal a um determinado órgão jurídico (apud MORAES, A.,2005, p.658).

Posteriormente, conclui que

Se o controle da constitucionalidade das leis é reservado a um único tribunal, este pode deter competência para anular a validade da lei reconhecida como inconstitucional não só em relação a um caso concreto, mas em relação a todos os casos a que a lei se refira _ quer dizer, para anular a lei como tal. Até esse momento, porém, a lei é válida e deve ser aplicada por todos os órgãos aplicadores do direito (apud MORAES, A.,2005, p.658).

Busca-se através do controle concentrado obter a declaração de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo independentemente da existência de caso concreto, visando a invalidação da lei, com o escopo de assegurar segurança jurídica às relações.
Podemos visualizar na CRFB/88 cinco espécies pertencentes ao gênero controle concentrado, a saber: Ação direta de inconstitucionalidade genérica – ADIN (art.102, I, a); Ação direta de inconstitucionalidade interventiva (art.36, III); Ação direta de inconstitucionalidade por omissão - AIOM (art.103, §2º); Ação declaratória de constitucionalidade – ADC (art.102, I, a); Arguição de descumprimento de preceito fundamental – ADPF (art.102, §1º) (MORAES, A., 2005, p.685)
Faremos uma tímida explanação acerca de cada espécie mencionada anteriormente:
Ação direta de inconstitucionalidade genérica (ADIN) - A competência para o processamento e julgamento da referida ação é do STF, trata-se de competência originária do aludido órgão, que tem de atuar quando existe contrariedade de lei ou ato normativo Federal ou estadual em face da Constituição. O autor da ação provoca o STF para que este examine a lei ou ato normativo Federal ou estadual (não existe caso a ser solucionado), o fim visado é a invalidação da lei para assegurar segurança jurídica. Cabe ressaltar que o STF não admite ADIN de lei ou ato normativo já revogado ou que já tenha perdido a eficácia. São legitimados para a propositura da referida ação: o Presidente da República, a Mesa do Senado Federal, a Mesa da Câmara dos Deputados, a Mesa da Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal, O Governador do Estado ou do Distrito Federal, O Procurador da República, O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Partido Político com representação no Congresso Nacional e Confederação Sindical ou Entidade de Classe de Âmbito Nacional. A regra é: sendo declarada a inconstitucionalidade da lei ou ato normativo federal ou estadual, a decisão terá efeito retroativo e para todos, cabe apontar que existem exceções. Não existe prazo para ajuizamento de ADIN.
Ação direta de inconstitucionalidade interventiva – A competência para o processamento e julgamento da referida ação é do STF. Quando a lei ou ato normativo do poder público, no exercício de sua competência constitucional estabelecida, vem a violar um dos princípios sensíveis da Constituição (forma republicana, sistema representativo e regime democrático; direitos da pessoa humana; autonomia municipal; prestação de contas da administração pública, direta e indireta; aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, oriundas de receitas de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações de serviços públicos de saúde) surge à necessidade do referido controle. A legitimação exclusiva para a propositura da aludida ação é conferida ao Procurador-Geral da República. Esta ação possui dupla finalidade, primeira de ter declarada a inconstitucionalidade formal ou material de lei ou ato normativo estadual (finalidade jurídica); segunda, ter a decretação de intervenção federal no Estado-membro ou distrito federal (finalidade política), conforme lições de Alexandre Moraes (2005, p. 685) configura um controle direto para fins concretos, o que torna inviável a concessão de liminar.
Ação de inconstitucionalidade por omissão (AIOM) – Tem cabimento à aludida ação quando o poder público deixa de cumprir com um dever que a Constituição lhe impõe. As omissões que dão origem a presente ação são aquelas relativas às normas constitucionais de eficácia limitada de princípio institutivo e de caráter impositivo, na qual a Constituição determina que o legislador expeça comandos normativos. Cabe apontar que as normas programáticas vinculadas ao princípio da legalidade também serão objeto de AIOM. Os legitimados para propositura da AIOM são os mesmo da ADIN (art.103, caput, CRFB/88). Declarada pelo STF a omissão, será dada ciência ao órgão competente para a adoção das medidas cabíveis (órgão administrativo – prazo de 30 dias para adoção de medidas; órgão legislativo, sem prazo preestabelecido). É incompatível com o objeto da referida ação a concessão de liminar.
Ação declaratória de constitucionalidade (ADC) – Foi introduzida em nosso ordenamento através da emenda constitucional n.º3, de 17/3/1993, posteriormente sofreu alterações por intermédio da EC n.º45/04. A competência para processamento e julgamento da referida ação é do STF, cabe apontar que no âmbito de ADC não há que se falar em declaração de constitucionalidade de lei ou ato normativo estadual, pois, conforme preconiza o art. 102, I, a, da Constituição a ADC só é cabível em se tratando de lei ou ato normativo federal. As decisões definitivas de mérito proferidas pelo STF produzirão eficácia contra todos e efeito vinculante, produzindo efeitos retroativos.
Arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) – A apreciação da referida ação compete ao STF, os legitimados ativos são os mesmos co-legitimados para propositura da ADC (art.103, caput, CRFB/88). A lei apresenta três hipóteses de cabimento para referida ação, a saber: evitar lesão a preceito fundamental resultante de ato do poder público; reparar lesão a preceito fundamental resultante de ato do poder público e quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucional de lei ou ato normativo federal, estadual e municipal, mesmo os incluídos antes da CRFB/88. É vedada a possibilidade de argüição de descumprimento de preceito fundamental quando não utilizados anteriormente outros meios hábeis capazes de sanar a lesividade. O STF poderá conceder medida liminar em sede de ADPF, desde que a decisão seja manifestada pela maioria absoluta de seus membros, em casos de extrema urgência ou perigo de lesão grave, ou, no recesso a referida decisão poderá ser deferida pelo Ministro-relator. A decisão na ADPF terá eficácia contra todos e efeitos vinculante relativamente aos demais órgãos do Poder público. A decisão pela procedência ou improcedência da ADPF é irrecorrível, não cabendo ajuizamento de ação rescisória.














Capítulo II - MUTAÇÕES CONSTITUCIONAIS

2.1 – Conceito de Mutação Constitucional

O fenômeno mutação constitucional foi visualizado inicialmente pelos autores tedescos do final do século XIX, posteriormente passou a ser estudado pelos demais países da Europa Continental, até que chegou ao Brasil.
A expressão mutação constitucional foi utilizada pela primeira vez no livro de Paul Laband em 1985, onde o referido autor demonstrava a diferença entre Verfassungänderung (reforma constitucional) e Verfassungswandlung (mutação constitucional), a partir deste marco vários autores se empenharam na árdua tarefa de conceituar o presente fenômeno jurídico (KUBLISCKAS, 2009, p.70).
George Jellinek, partindo das nomenclaturas pré-dispostas por Laband, preconiza que deve ser entendida por reforma constitucional a modificação dos textos constitucionais produzidas por ações involuntárias e propositais e por mutação constitucional a modificação que deixa seu texto incólume, que se produz através de fatos isolados pela intenção ou consciência de tal mutação, o autor entende que a mutação constitucional se caracteriza por ser um fenômeno involuntário.
O chinês Hsü-Dau-Lin propõe de modo inovador uma sistematização das mutações constitucionais e as define como sendo a incongruência que existe entre as normas constitucionais por um lado e a realidade constitucional real (KUBLISCKAS, 2009, p.70).
O autor Karl Loewenstein tem seu entendimento influenciado pela concepção sociológica de Constituição, para o referido autor mutação constitucional é o fenômeno através do qual é produzida uma transformação na configuração real do poder político, da estrutura social ou do equilíbrio de interesses sem que seja refletida tal transformação no documento constitucional: o texto da Constituição permanece intacto. Este tipo de mutação constitucional ocorre em todos os Estados dotados de uma Constituição escrita e é muito mais frequente que as reformas constitucionais formais (1965, p.165).
Mais recentemente os autores passaram a sustentar que mutação constitucional é o fenômeno através do qual são produzidas alterações de significado, sentido ou alcance das normas constitucionais dentro dos limites impostos pela própria constituição.
No Brasil o tema mutação constitucional tem sido debatido e foi alvo de alguns trabalhos. Anna Cândida da Cunha Ferraz, manifesta o entendimento de que o fenômeno mutação Constitucional
Consiste na alteração, não da letra ou do texto expresso, mas do significado, do sentido e do alcance das disposições constitucionais, por meio ora da interpretação judicial, ora dos costumes, ora das leis, alterações essas que, em geral, se processam lentamente, e só se tornam claramente perceptíveis quando se compara o entendimento atribuído às cláusulas constitucionais em momentos diferentes, cronologicamente afastados uns dos outros, ou em épocas distintas e diante de circunstâncias diversas (1986, p.10/11).

Conforme preconiza Anna Cândida, a mutação constitucional altera o sentido da norma sem alterar o texto, mantendo intocável seu espírito.
Tão importante quanto o entendimento da autora mencionada no parágrafo anterior, é o entendimento de Uadi Lammêgo Bulos, que define mutação constitucional como sendo
O processo informal de mudanças da constituição, por meio do qual são atribuídos novos sentidos, conteúdos até então não ressaltados à letra da Lex Legum, quer através da interpretação, em suas diversas modalidades e métodos, quer por intermédio da construção (construction), bem como dos usos e costumes constitucionais (1997, p.57).

Outros autores brasileiros também definem o fenômeno, cabe apontar dentre eles o autor José Afonso da Silva que se manifesta de forma crítica acerca do tema, para o mesmo, o fenômeno é definido como mudanças não formais que se operam no correr da história de uma Constituição, sem alterar o enunciado formal, sem mudar a letra do texto (2000, p.297).
O conceito de mutação constitucional da mesma forma que o conceito de Constituição evoluiu com o passar dos anos.
A doutrina tradicional representada por autores como Paul Laband, George Jellinek, Hsü Dau-lin, dentre outros, apresentava um conceito bastante amplo e abstrato para mutação constitucional, entendendo-a basicamente como uma situação de conformidade entre a Constituição e a realidade constitucional, tal conceito sofreu inúmeras críticas, dentre elas merece destaque à realizada por José Afonso para quem a concepção ampla é incompatível com as constituições rígidas, já que as coloca em estado de eventual flexibilidade para se adaptar sem deformações maliciosas e sem subversões traumatizantes às mutações da vida dos povos (SILVA, 2000, p.295).
Para o referido autor à aludida concepção debilita o sentido normativo da Constituição, pois destrói a função racionalizadora, estabilizadora e limitadora do poder que é conferido as constituições rígidas.
É importe frisar que os tradicionalistas desenvolveram sua doutrina acerca do tema entre o final do século XIX e o início do século XX, época em que não estavam consolidados os mecanismos de controle de constitucionalidade asseguradores da supremacia e normatividade das constituições.
Com o arraigamento dos mecanismos de controle de constitucionalidade, houve verdadeira reafirmação de entendimentos concernentes à mutação constitucional que passou a ter um conceito restrito.
De acordo com tal conceito, respaldado nos ensinamentos de Konrad Hesse, a mutação constitucional passou a ser vista como fenômeno absolutamente legítimo de evolução constitucional, desde que realizada dentro de certos limites impostos pela ordem constitucional.
Conforme sustenta Hesse, a mutação constitucional não deve ser vista de forma puramente genérica, como a contradição entre a norma e a realidade, mas deve levar em conta os limites que separam a transgressão constitucional, ou seja, a mutação constitucional não deve contradizer o texto da constituição nem o seu fim principal.
J.J. Gomes Canotilho seguindo a mesma esteira de raciocínio de Hesse sustenta que a mutação constitucional apenas será legítima se realizada dentro de seu programa normativo, eis a seguir seu entendimento sobre o tema
Uma coisa é admitirem-se alterações no âmbito ou esfera da norma que ainda se podem considerar susceptíveis de serem abrangidas pelo programa normativo (Normprogram), e outra coisa é legitimarem-se alterações constitucionais que se traduzem na existência de uma realidade constitucional inconstitucional, ou seja, alterações manifestamente incomportáveis pelo programa da norma constitucional. Uma constituição pode ser flexível sem deixar de ser firme. A necessidade de uma permanente adequação dialética entre o programa normativo e a esfera normativa justificará a existência de transições constitucionais que, embora traduzindo a mudança de sentido de algumas normas provocado pelo impacto da evolução da realidade constitucional, não contrariam os princípios estruturais (políticos e jurídicos) da constituição. O reconhecimento destas mutações constitucionais silenciosas (´stile Verfassungswandlungen´) é ainda um acto legítimo de interpretação constitucional. Por outras palavras que colhemos em K. Stern: a mutação constitucional deve considerar-se admissível quando se reconduz a um problema normativo-endogenético, mas já não quando ela é resultado de uma evolução normativamente exogenética (2000, p.1192).

José Afonso afirma que para ser válida a mutação constitucional, faz-se necessário que a mesma seja acolhida por nossa lei maior, e, aduz sustentando que desta forma seria plenamente justificável a posição de Hesse em favor de um conceito restrito, no sentido de que a mutação, sem ofender a Constituição, transforma o sentido, o significado e o alcance se suas normas, sem alterar o enunciado formal, sem mudar a letra do texto.
Para José Afonso se uma conduta ou uma prática política não se amolda à Constituição, não se trata de forma de mutação constitucional e sim forma de desrespeito, de fraude à Constituição (2000, p.295).
O conceito restrito atualmente é o mais utilizado pela doutrina, partindo desta premissa, Wellington Márcio Kublisckas, aproveitando o entendimento de outros doutrinadores define mutação constitucional como sendo

O fenômeno por meio do qual, sem emendas ou revisões (processos formais de mudança da Constituição), são introduzidas, no processo de concretização/aplicação, por meio de interpretação constitucional e/ou da integração pelos costumes, alterações no sentido, significado ou alcance de determinadas normas constitucionais (que tenham o conteúdo minimamente aberto/elástico), desde que estas alterações sejam comportadas pelo programa normativo, ou seja, promovam o desenvolvimento, complementação, estabelecimento etc., das normas constitucionais escritas, mas não violem nem a sua letra e tampouco o seu espírito (2009, p.78).

Outro ponto que merece atenção, ainda dentro do conceito mutação constitucional, é a sua terminologia, no Brasil, como em tantos outros países, o fenômeno não apresenta denominação uniforme.
Pinto Ferreira utilizou o termo mudança material, Anna Cândida da Cunha Ferraz utilizou o termo processos informais, nos fins da década de 90, Uadi Lammêgo Bulos adotou o termo mutação constitucional.
Autores contemporâneos têm utilizado o termo mutação constitucional, como é o caso de José Afonso da Silva, Carmem Lúcia Antunes Rocha, dentre outros.
Nesta monografia escolhemos, com base na doutrina contemporânea, adotar o termo mutação constitucional.

2.2 – Características e pressupostos das mutações constitucionais

Aproveitando os ensinamentos de Wellington Márcio, temos que as mutações constitucionais apresentam as seguintes características:
Informalidade – As mutações constitucionais não estão elencadas no rol de mudanças formais da Constituição brasileira (revisão e emendas). As modificações operadas através de mutações são introduzidas em nosso ordenamento sem formalidades, através de interpretação das normas constitucionais, observados os acontecimentos e pensamentos ocorridos no seio da sociedade.
Pluralidade de agentes – As mutações constitucionais são operadas pelos Poderes executivo, legislativo e judiciário, mas também pelos membros da sociedade, por meio de opinião pública, atuação dos grupos de pressão organizados, etc.
Distanciamento no tempo – As mutações constitucionais se processam ao longo do tempo de forma vagarosa, somente podendo ser visualizadas através de comparações entre as compreensões presentes e as pretéritas. No entanto a afirmação realizada não apresenta entendimento doutrinário unânime, Konrad Hesse, por exemplo, entende que o fato das mutações serem percebidas devido a comparações de entendimentos ocorridos em momentos distintos não pode ser entendido como regra absoluta. Para Bulos, mutações constitucionais podem ocorrer lentamente, bem como em momentos próximos, o referido autor apresenta uma posição intermediária, que parece ser a mais coerente, conforme preconiza Wellington Márcio

“A mutação constitucional pode ocorrer, de fato, em momentos afastados no tempo, através da lenta consolidação de um novo entendimento acerca de determinado dispositivo constitucional ou da formação de uma prática constitucional. Contudo, pode ocorrer de forma abrupta e radical, como, por exemplo, nos casos em que um determinado tribunal fixa um novo entendimento sobre uma matéria já pacificada – o chamado overrulling” (2009, p.82).

Manutenção do texto/modificação da norma – Como já fora salientado, a mutação constitucional produz uma mudança no significado, sentido ou alcance da norma, sem que seja introduzida mudança expressa no texto constitucional, nesta esteira de raciocínio fica transparente que a aceitação de mutação constitucional representa a aceitação de significados distintos para texto e norma constitucional.
Sujeição a limites – As mutações constitucionais Somente serão tidas como legitimas quando comportadas pelo ordenamento constitucional geral, ou seja, as mutações constitucionais deverão ser introduzidas de modo a desenvolver, atualizar ou complementar as normas escritas, caso a mutação não esteja compatível com ordenamento constitucional escrito, será tida como inconstitucional.
Apresentadas as características das mutações constitucionais passemos a análise dos pressupostos das mutações constitucionais, aceitos de modo disperso pela doutrina:
Abertura/elasticidade constitucional – Um dos mais importantes pressupostos para ocorrência das mutações constitucionais em um determinado país é o grau de abertura que apresenta sua constituição.
As constituições não são completas e acabadas, pois seus elementos necessitam constantemente de atualização e interação junto ao corpo social, nesse sentido, estando a Constituição no vértice da pirâmide normativa, faz-se necessário um maior grau de abertura e elasticidade de suas normas a fim de que as mesmas se adéqüem aos fatos oriundos da sociedade, fazendo que exista realidade no sentido das normas constitucionais.
A abertura do sistema não paira apenas na da Constituição, repousa ainda na abertura das normas constitucionais. Tal abertura deve ser observada basicamente sob alguns aspectos (CANOTILHO, 2000, p.1192), a saber:
Caráter principiológico das normas constitucionais - os princípios constitucionais são normas que apresentam maior grau de abstração e menor densidade jurídica, o que confere ao interprete maior liberdade em sua tarefa, analogicamente falando, a fim de elucidar a afirmação: quando extraímos a seiva da planta, retiramos da mesma o seu essencial, tal fato nos é permitido, de mesma forma, tendo o interprete maior liberdade de atuação, já que normas principiológicas apresentam maior grau de abstração, fará o mesmo, ou seja, retirará sua seiva, logo um número maior de normas principiológicas na constituição trará por via de conseqüência o favorecimento para a ocorrência de mutações constitucionais, sem abalos no sistema, pois fará a compatibilização do pensamento social com a norma constitucional.
Frequência relativa à necessidade de harmonização das normas constitucionais - significa dizer que a constituição deve ser vista como um todo, ou seja, suas normas devem ser enxergadas sem verticalização entre si, pois todas elas apresentam a mesma importância não havendo que se falar em hierarquia.
Existência de normas constitucionais de eficácia limitada - nesta norma é necessária à edição de lei infraconstitucional posterior para regulamentação, sendo possível neste momento à implementação de mudança no sentido da norma, conclui-se que o elevado número de normas de eficácia plena ocasionará a maior incidência de mutações constitucionais.
Lacunas das normas constitucionais - como é cediço, a Constituição não é perfeita, tão pouco completa, é uma norma aberta que comporta evolução e modificações, sendo possível o suprimento de lacunas porventura existentes por diversas vias, inclusive por meio de mutações constitucionais.
Anna Cândida sustenta que a admissibilidade das mutações constitucionais repousa sobre dois fundamentos: um de ordem jurídica e outro de ordem lógica (1993, p.18).
Conforme preconiza a aludida autora, o respaldo jurídico das mutações constitucionais seria uma espécie de poder denominado Poder Constituinte difuso, eis que não é reconhecido pela mesma o enquadramento das mutações constitucionais nas espécies formais de Poder constituinte, ou seja, não se insere no Poder Constituinte Originário, tampouco no Poder Constituinte derivado.
A existência de um Poder constituinte difuso e informal foi reconhecida por tantos outros renomados autores, como José Alfredo de oliveira e Cármem Lúcia, Antunes da Rocha. Logo, pode-se concluir que as mutações encontram fundamento em um poder constituinte difuso, inorgânico, informal e espontâneo, que é oriundo implicitamente do poder constituinte originário e cuja finalidade é de observado o texto escrito, preencher vazios e sanar obscuridades do texto constitucional, continuando a obra do constituinte original e mantendo viva a Constituição (KUBLISCKAS, 2009, p.97).

2.3 – Limites das Mutações Constitucionais

As mutações constitucionais podem ser definidas brevemente, como fenômeno através do qual se altera o sentido, alcance da norma constitucional sem vulnerar-lhe o texto expresso, tudo feito sem acionar os mecanismos tradicionais de reforma, trata-se de fenômeno informal, cuja ocorrência pratica passa quase que imperceptível.
A doutrina contemporânea sustenta entendimento que as constituições são compostas por normas jurídicas e que em sua maioria apresentam peculiaridades em relação às demais normas do ordenamento, tais como conteúdo político, maior abertura e flexibilidade, maior generalidade e abstração, ainda assim, são normas jurídicas que devem ser respeitadas.
Partindo das afirmações supramencionadas, surge a seguinte dúvida: estariam às mutações constitucionais sujeitas a limites? Se positivo, quais seriam esses?
Os primeiros autores a estudarem o assunto acreditavam que dada à informalidade das mutações constitucionais, estariam estas isentas de controle de constitucionalidade, não podendo ser limitadas juridicamente.
George Jellinek afirmou que as proposições jurídicas são incapazes de dominarem, efetivamente a distribuição do poder estatal e que as forças políticas reais operam segundo as suas próprias leis e atuam independentemente de qualquer forma jurídica.
Autores posteriores adotando a idéia de que as mutações não são apenas um fenômeno fático e sim jurídico, começaram a delinear-lhes limites, nesse sentido destaca-se o autor Hermann Heller, para quem as mutações constitucionais encontram limitações na própria normatividade da Constituição, admitindo-se apenas mudanças no interior da norma, ou seja, em seu sentido.
De grande valia está também o posicionamento de Konrad Hesse, que afirma
Falta resposta precisa à questão da existência de limites a modificações deste tipo e onde se situam tais limites [...] Não foram empreendidas, ao menos que saibamos outras tentativas de se fixar limites às mutações, contrariamente à questão dos limites da reforma constitucional, que recebeu tratamento amplo [...] A garantia da constituição exige o controle e, no caso, o bloqueio de diversas vias de erupção, ficando incompleta quando alguma delas não é atendida.


Hesse explica que a ocorrência de mutações constitucionais é limitada pelas normas constitucionais escritas, pois as condutas realizadas fora deste padrão não podem ser tidas como realidade constitucional, pois estariam contra a própria Constituição, o referenciado autor escreveu inclusive uma monografia sobre o tema, intitulada Grenzen der Verfassungswandlung (limites da mutação constitucional).
Seguindo a linha de raciocínio ora apresentada, os limites da mutação constitucional estariam onde terminam as possibilidades de uma compreensão conveniente do texto da norma, tal limite é insuperável, pressuposto da função racionalizadora, estabilizadora e limitadora do poder da Constituição.
No Brasil Anna Cândida da Cunha Ferraz, apesar de não ter dispensado um tópico específico acerca do assunto, também delineou traços importantes relativos aos limites aos quais devem se submeter às mutações constitucionais, afirmou que a mutação constitucional altera o sentido, o significado e o alcance do texto constitucional sem violar-lhe a letra e o espírito. Tratando-se, pois, de mudança constitucional que não contraria a Constituição, ou seja, que direta ou indiretamente é acolhida pela Lei maior.
Depreende-se dos ensinamentos da aludida autora que esta segue o mesmo entendimento que Hesse, ou seja, que o limite das mutações constitucionais é a própria Constituição escrita, tudo que for manifestamente contrário a ela não configura mutação Constitucional, mas sim mutação inconstitucional. Tal entendimento é compartilhado por José Afonso da Silva, que destaca

O problema dos limites da mutação começa quando a tensão entre os fatos e a normatividade se converte social, política e juridicamente em um conflito que põe em perigo a mesma noção de supremacia, é então quando aparece como única alternativa possível a de, ou bem converte a prática convencional (a mutação) em norma através da reforma, ou bem negar o valor jurídico da mutação, em nome da legalidade existente [...] Tais delimitações e outras que a doutrina vai construindo asseguram melhor a defesa da Constituição diante dos perigos das mutações constitucionais. Nesse contexto, admitindo a possibilidade da existência de mutações constitucionais, ou seja, mudanças de significado, sentido e alcance das normas constitucionais sem a alteração do texto escrito, ganha relevância a questão dos limites das mutações constitucionais. Admitir que as mutações constitucionais são ilimitadas eliminaria o caráter normativo da Constituição e colocaria em risco seu caráter estabilizador (2000, p.297).

Visão diferente acerca dos limites das mutações constitucionais é dada por Uadi Lâmmego Bulos, para quem é impossível fixar-lhes, dada a informalidade que sobrepõe o fenômeno, sendo os únicos limites consideráveis os meramente subjetivos, ou seja, a consciência do interprete em não desrespeitar a norma constitucional (1997, p.91).
Seguindo o entendimento de Wellington Márcio Kublisckas (2009, p.156), com devido respeito à posição dos demais doutrinadores, uma mutação constitucional deve ser tida como aceitável quando o ato do qual se originar não contrariar de modo evidente o espírito da constituição, estiver devidamente fundamentado nos preceitos constitucionais interpretados, for racional e legitimamente aceito pela comunidade jurídica, não podendo subverter o conteúdo das normas constitucionais.
De tudo que foi exposto, é possível afirmar que existem limites subjetivos e objetivos aplicáveis às mutações constitucionais, a saber:
Limites subjetivos: Postura ética do aplicador da norma constitucional (não desrespeitar ou contrariar a norma constitucional) e consciência jurídica geral (o aplicador da norma não age isoladamente do corpo sociopolítico, encontra-se em situação de troca com os demais personagens sociais, devendo manter relação recíproca de retro-alimentação - feedback – o aplicador recebe influências da sociedade, uma norma alterada através de mutação que não se amolda a consciência jurídica geral não será tida como válida, a sociedade não a cumprirá e fará de tudo para afastá-la do ordenamento jurídico).
Limites objetivos: Programa normativo (significa dizer que as mutações constitucionais não podem contrariar a letra ou o espírito da constituição, sob pena de serem consideradas inconstitucionais) e a necessidade das mutações serem fundamentadas e razoáveis (o interprete não deve valer-se de convicções próprias desprovidas de argumentações compreensíveis e racionalmente sustentáveis).
Conforme exposto, é notório que as mutações constitucionais não são ilimitadas, possuem limites que buscam nortear a atividade dos operadores e constituem verdadeiros parâmetros dentro dos quais tais mutações serão tidas por válidas e legítimas, tais limitações instituem a fronteira demarcatória entre a constitucionalidade e a inconstitucionalidade.




















Capítulo III – MODALIDADES DE MUTAÇÕES CONSTITUCIONAIS

A doutrina diverge acerca das espécies do gênero mutação constitucional, existe uma corrente, a qual se filia Wellington Márcio Kublisckas, que entende que o gênero mutação constitucional apresenta apenas duas espécies: Mutação constitucional por interpretação e Mutação constitucional pelos costumes, posição que trazemos na presente monografia. No entanto existem outros entendimentos, como o de Uadi Lammêgo Bullos, para este existe uma terceira espécie para o gênero mutação constitucional, que seria a mutação constitucional por construção, faremos uma abordagem sucinta acerca desta espécie, seguindo o entendimento dos doutrinadores que entendem que esta se insere na espécie mutação constitucional por interpretação.

3.1 – Considerações acerca de interpretação Constitucional

É inegável a importância das interpretações de textos constitucionais para os diversos ordenamentos jurídicos, a sociedade evolui a cada momento, transformando seu pensamento e a forma de enxergar as coisas, tal fato pode ser evidenciado mesmo fora do mundo jurídico, por exemplo, através da existência de obras de arte como a da Pietá de Miguel Angelo e da Nona Sinfonia de Beethoven, que com o passar dos séculos vão enriquecendo e ampliando com novas interpretações, que mesmo sendo diferentes não invalidam as anteriores, é um verdadeiro processo de conservação e aprimoramento de significados.
No campo do direito, de mesmo modo, encontramos obras de arte, representadas pelos intitulados monumentos legislativos, como a lei das XII Tábuas; O Corpus Juris Civilies e outros, diante das quais várias gerações de juristas se debruçam para produzir interpretações sempre renovadas, talvez seja por tal fato que alguns juristas, como Radbruch, afirme que a interpretação jurídica não é pura e simplesmente um pensar de novo aquilo que já foi pensado, mas, pelo contrário, um saber pensar até o fim aquilo que já começou a ser pensado por outro (COELHO, 2007, p.35).
No período pós-Segunda Guerra Mundial, com o advento do fenômeno conhecido como constitucionalização da ordem jurídica, o assunto interpretação constitucional entrou em voga, tendo sido objeto de inúmeros estudos.
Na presente monografia não se tem a pretensão de esgotar as técnicas de interpretação constitucional, mas traçar linhas gerais a fim de que se possam entender os métodos interpretativos que geram mudanças por meio de mutações constitucionais.
Conforme preconiza Inocêncio Mártires Coelho é indispensável que sejam estabelecidos padrões mínimos de racionalidade e de controlabilidade na interpretação jurídica, para tanto é necessário que se estabeleça um critério de verdade, que permita distinguir uma interpretação falsa de uma verdadeira, para o referido autor, tal critério encontra-se consubstanciado na consciência jurídica geral e no devido processo legal, os aludidos princípios no decorrer dos anos têm se mostrado razoáveis, já que impedem os voluntarismos e não inibem a necessária criatividade dos intérpretes e aplicadores do direito (2007, p.6).
O vocábulo interpretar vem do latim interpres, significa atribuir significado a coisas, sinais fatos ou acontecimentos; desentranhar o sentido de uma expressão, explicar ou aclarar o sentido das coisas, fatos, sinais, acontecimentos; dar o significado do vocábulo, atitude ou gesto; reproduzir, por outras palavras, um pensamento exteriorizado (FERRAZ, 1986, p.19).
Como se depreende das idéias apresentadas, a atividade interpretativa é desenvolvida sobre todos os objetos culturais agrupados nos diversos ramos do conhecimento humano, na economia, sociologia, política e principalmente no direito.
Para Anna Cândida da cunha Ferraz a interpretação constitucional é uma espécie do gênero interpretação jurídica, revestida de características próprias, derivadas principalmente da natureza e das notas distintivas das disposições constitucionais: supremacia e rigidez constitucional, diferentes conteúdos das normas constitucionais, caráter sintético, esquemático e genérico da Constituição, etc. (1986, p.19).
É pacífico que a interpretação constitucional apresenta algumas peculiaridades, respeitadas estas e as condições de realidade que as envolve, J.J. Gomes Canotilho diferencia interpretação, densificação e concretização constitucional da seguinte forma:
Interpretação Constitucional: interpretar uma norma constitucional consiste em atribuir um significado a um ou vários símbolos lingüísticos escritos na Constituição com o fim de se obter uma decisão de problemas práticos - normativos constitucionalmente fundados. Sugerem-se aqui três dimensões importantes da interpretação da Constituição: (1) interpretar a Constituição significa procurar o direito contido nas normas constitucionais; (2) investigar o direito contido na lei constitucional implica uma atividade – atividade complexa – que se traduz fundamentalmente na ‘adscrição’ de um significado a um enunciado ou disposição linguística (texto da norma); (3) o produto do ato interpretado é o significado atribuído.
Densificação de normas: densificar uma norma significa preencher, complementar e precisar o espaço normativo de um preceito constitucional, especialmente carecido de concretização, a fim de tornar possível a sua concretização e a conseqüente aplicação a um caso concreto.
Concretização da Constituição: concretizar a Constituição traduz-se, fundamentalmente, no processo de densificação de regras e princípios constitucionais. A concretização das normas constitucionais implica um processo que vai do texto da norma (do seu enunciado) para uma norma concreta – norma jurídica – que, por sua vez, será apenas um resultado intermédio, pois só com a descoberta da norma de decisão para a solução dos casos jurídico-constitucionais teremos o resultado final da concretização. Esta ‘concretização normativa’ é, pois, um trabalho técnico-jurídico; é, no fundo, o lado ‘técnico’ do procedimento estruturante da normatividade. A concretização, como se vê, não é igual à interpretação do texto da norma; é, sim, a construção de uma norma jurídica.
A concretização parte do texto da norma, com atribuição de significado ao texto jurídico, não se esgotando nesta atribuição, pois exige também solução para os problemas que carecem de decisão. Autores contemporâneos têm denominado este processo de conceito moderno de interpretação (CANOTILHO, 2000, p.1179/1184).
O aludido conceito dispõe que os fatos concretos (realidade) e os elementos normativos são vistos como objetos concatenados e inseparáveis de um mesmo processo de criação da norma constitucional.
A função primordial da interpretação constitucional, de acordo com Anna Cândida da Cunha Ferraz é a de criar condições para a aplicação da norma Constitucional a um determinado caso concreto. Quem é chamado a aplicar a norma constitucional deve necessariamente interpretá-la, já que a aplicação da norma exige, antes, a interpretação, momento essencial e pressuposto indispensável para a aplicação, se por interpretação se entende o processo lógico mediante o qual se assinala e se põe em evidência o conteúdo da disposição legal ou constitucional (1986, p.22/23).
A interpretação constitucional diferencia-se da interpretação jurídica em função do objeto – as normas constitucionais. Dentre as peculiaridades e métodos para interpretação constitucional destacam-se:
Superioridade hierárquica - exige dos textos jurídicos a subordinação a lei maior;
Peculiaridade semântica - na Constituição são encontradas muitas normas de caráter principiológico, que apresentam maior abertura, maior grau de abstração, conferindo ao intérprete da norma alto grau de discricionariedade.
Caráter político – Conforme lições de Paulo Bonavides

A norma constitucional é de natureza política, porquanto rege a estrutura fundamental do Estado, atribui competências, poderes, dispõe sobre os direitos humanos básicos, fixa o comportamento dos órgãos estatais e serve, enfim, de pauta à ação dos governos, visto que no exercício de suas atribuições não podem eles evidentemente ignorá-la. As relações que a norma constitucional, pela sua natureza mesma, costuma disciplinar são de preponderante conteúdo político e social e, por isso mesmo sujeita a um influxo político considerável, senão essencial, o qual se reflete diretamente sobre a norma, bem como sobre o método interpretativo aplicável (1999, p.420).

Ainda que a interpretação da constituição tenha caráter político, deverá ser tida como uma tarefa jurídica, sujeitando-se aos cânones da racionalidade, objetividade e motivação, não sendo, por conseguinte aleatória.
Embora a interpretação Constitucional seja espécie do gênero interpretação jurídica apresenta princípios próprios, dentre os quais se destaca:
Princípio da unidade da Constituição – a Constituição deve ser interpretada na sua totalidade procurando harmonizar os espaços de tensão existentes entre as normas constitucionais a concretizar, deve ser interpretada de modo a evitar contradições entre as normas contidas em seu corpo, pois todas possuem igual dignidade. Caso ocorram tensões entre as normas constitucionais, estas deverão ser solucionadas por meio da ponderação entre bens jurídicos tutelados, tal técnica deve ser utilizada com parcimônia pelo intérprete. Nesse sentido ganha importância o princípio abaixo elencado.
Princípio da concordância prática ou da harmonização – Significa dizer que o intérprete da norma constitucional deve buscar sempre a combinação dos bens jurídicos, de forma a evitar o sacrifício de uns em detrimento de outros. Tal princípio tem como pressuposto o fato de não existir hierarquia entre as normas constitucionais, estabelecendo no caso de conflitos, limites e condicionamentos bilaterais, aplicando-se os critérios da razoabilidade e da proporcionalidade.
Princípio da força normativa da Constituição – o Intérprete deve buscar a plena eficácia da lei fundamental.
Princípio do efeito integrador – Deve-se dar primazia aos pontos de vista que possibilitem a integração política e social.
Princípio da justeza ou da conformidade funcional – Tem como objetivo principal impedir quando da concretização das normas constitucionais, que se altere a repartição de funções constitucionalmente estabelecidas.
Além de princípios a interpretação constitucional conta com métodos próprios. A doutrina divide tais métodos, basicamente em métodos tradicionais de interpretação e métodos modernos de interpretação.
Os métodos tradicionais tinham como finalidade essencial, revelar a vontade da norma, dentre eles destacam-se: método gramatical (busca o sentido literal dos vocábulos, onde o espírito da constituição é extraído), método lógico (busca reconstruir a vontade do constituinte) e o método analógico (o intérprete atribui a um caso ou matéria não regulamentado a mesma disciplina prevista pelo legislador para caso ou matéria análoga.
Com o passar dos tempos também foram incorporados a interpretação constitucional elementos extrajurídicos, constituindo-se os denominados métodos modernos de interpretação constitucional, podendo ser destacados os infra mencionados:
Método científico-espiritual – tem como fundamento compreender o sentido e a realidade de uma lei constitucional, alcançar o espírito da Constituição, com isso o elemento político adquire relevância extrema.
Método tópico-problemático – centraliza-se no caso concreto e não no contexto sistemático, o problema passa a ser considerado o eixo central da atividade interpretativa. Este método foi alvo de inúmeras criticas, dentre elas destacamos a realizada por J.J. Gomes Canotilho, para quem:

A concretização do texto constitucional a partir do topoi merece sérias reticências. Além de poder conduzir a um casuísmo sem limites, a interpretação não deve partir do problema para a norma, mas desta para os problemas. A interpretação é uma actividade normativamente vinculada, constituindo a ‘constitutio scripta’ um limite inelimitável (Hesse) que não admite o sacrifício da primazia da norma em prol da prioridade do problema (2000, p.1175).

Método normativo-estruturante – Foi desenvolvido por Friedrich Müller. Retrata a distinção entre norma e texto da norma, é resultado de um trabalho de construção através do texto, onde a norma constitucional não seria apenas o ponto de partida, mas o resultado da concretização na medida em que não estaria inserida no texto e nem antecederia ao trabalho do operador do direito. Autores filiados a este método, que é moderno, criticam os métodos tradicionais, apontando que estes seriam incapazes de realizar a concretização da norma, casando a realidade com a norma, alegam que os adeptos dos métodos tradicionais ficariam presos a interpretação do texto da norma.
Método hermenêutico-concretizador – Foi desenvolvido por Konrad Hesse. Preconiza que a interpretação constitucional não é um procedimento de submissão, mas de concretização, eis que apresenta um caráter criador do conteúdo da norma interpretada, a principal virtude do referido método é coadunar realidade e norma.

3.2 – Mutações por interpretação Constitucional

Feitas as devidas considerações, passemos a apresentação da interpretação como mecanismo de mutação constitucional.
As normas constitucionais exigem uma interpretação que as precise e complemente, tendo em vista sua estrutura; dependem de um preenchimento, visto que o constituinte voluntária ou involuntariamente deixou espaços em aberto.
A função criadora da interpretação ainda não é aceita de modo pacífico. Para alguns autores que não a aceitam, por meio de uma interpretação objetiva seria possível descobrir o significado da norma, onde o interprete/aplicador deveria interpretá-las de acordo com o seu significado linguístico, mantendo-se fiel à vontade do legislador.
Paripassu a corrente supra referenciada, existe outra, pregando que o intérprete/aplicador não tem de investigar o verdadeiro significado da norma, mas sim lhe conferir o sentido que mais corresponde à realidade e ao sistema de valores na qual está inserida. Para os autores filiados a esta corrente, o intérprete-aplicador deve considerar não apenas a semântica do texto, mas também à vontade do legislador, e ainda à vontade da Constituição, valores substantivos, como a justiça, a igualdade, a liberdade, etc.
Com base na moderna doutrina, adota-se o entendimento de que a interpretação não pode ser vista apenas como processo reprodutivo da vontade de outrem, mas como processo produtivo e criador de sentido, não estando, porém o intérprete autorizado a desvincular-se totalmente da norma, mas apenas conferir a este a possibilidade de atuar dentro dos limites da discricionariedade, quando a norma estiver obscura ou polissêmica, adotando por via de conseqüência decisões inovadoras.
A mutação constitucional interpretativa pode ocorrer dentre outras situações quando: Existir um alargamento do sentido do texto constitucional; para imprimir sentido determinado e concreto ao texto constitucional; quando houver necessidade de modificar o texto constitucional anterior, atendendo à evolução da realidade constitucional (overruling); para adaptar o texto constitucional a nova realidade social; para adaptar o texto constitucional no momento de sua aplicação; para o preenchimento de lacunas do texto constitucional, etc. (KUBLISCKAS, 2009, p.119).
A mutação constitucional interpretativa é um fenômeno que pode ser nitidamente percebido através da concretização/aplicação das normas constitucionais aos casos concretos.
A construção é o processo ou arte de determinar o sentido, o significado real, a explicação dos termos obscuros ou ambíguos de uma lei, constituindo um critério extrajurídico que busca confrontar elementos intrínsecos, aqueles existentes no texto maior, com elementos extrínsecos, tais como fatos, valores, etc. que não são estranhos à letra constitucional, mesmo não estando contidos nela.
Conforme preconiza Uadi Lammêgo Bullos, diz-se construção constitucional o expediente supletivo, por meio do qual se constrói ou recompõe o direito aplicável, nas circunstâncias de premência e necessidade, para suprir as deficiências ou imperfeições da manifestação constituinte originária (1997, p.141).
Na construção constitucional uma dada circunstância autoriza o intérprete a sair do texto constitucional e procurar para os casos obscuros, uma solução não prevista pelos constituintes, permitindo que o mesmo vá além das normas constitucionais, para captar as exigências sociais, as necessidades práticas da vida.
Não estando o aplicador do direito escravizado a norma, poderá lançar mão dos expedientes postos a sua disposição, como a analogia, a equidade, os princípios gerais do direito, as máximas da experiência, os usos e costumes, preenchendo os vazios normativos, resolvendo os problemas que aparentemente pareciam intransponíveis se fosse aplicado apenas o direito positivado.
Considerando os sujeitos competentes para proceder à interpretação constitucional, a doutrina distingue interpretação orgânica (realizada pelos órgãos do poder publico competentes constitucionalmente para concretizar e aplicar as normas constitucionais, realizada pelo poderes legislativo, executivo e judiciário) da interpretação inorgânica (possibilidade da sociedade geral, por meio da influencia e pressão exercida sobre os interpretes orgânicos, participe, ainda que indiretamente da interpretação constitucional) (KUBLISCKAS, 2009, 124).
A interpretação constitucional orgânica legislativa é realizada pelo órgão legislativo, quando este ao promulgar uma lei tenha por objetivo disciplinar a aplicação de alguma norma constitucional, atribuindo a norma um sentido concreto. A interpretação em comento é nitidamente visível, por exemplo: quando o constituinte deixa ao legislador a função de completar o sentido da norma constitucional ou precisar o sentido dos elementos de contenção que limitam ou condicionam a eficácia da norma constitucional.
Nesse sentido, o fenômeno será visto com maior freqüência quando estiver relacionado às normas de eficácia contida e as normas de eficácia limitada.
Respeitados os limites estabelecidos, as leis de aplicação constitucional de modo invisível mudam a constituição, conferindo-lhe novos significados, com alcance maior ou às vezes menor.
Outra modalidade de interpretação orgânica é a interpretativa administrativa, realizada pelo poder executivo, que se opera mediante atos, resoluções, etc. Onde se busca a aplicação da constituição a casos concretos ou a declaração de inconstitucionalidade de leis e atos normativos. A principal característica desta modalidade é o seu grau de limitação em relação às demais modalidades, tendo em vista que está limitada tanto pela Constituição quanto pelas leis, submetendo-se ao controle judicial de constitucionalidade e legalidade.
Por fim, a terceira modalidade de interpretação constitucional orgânica é a interpretação judicial, que é realizada pelos tribunais no exercício da jurisdição constitucional.
A jurisdição constitucional é exercida atualmente pelos tribunais superiores e inferiores é realizada basicamente de duas maneiras: pela aplicação direta do preceito constitucional (caso concreto – questão constitucional) e pela verificação da compatibilidade da norma com o texto constitucional (controle de constitucionalidade).
A interpretação constitucional orgânica judicial possui as seguintes características: primariedade, inércia, definitividade, mutabilidade e vinculação.
É de se observar que quanto maior for o grau de abertura e abstração constitucional, maior será atividade interpretativa judicial e quanto maior forem às limitações impostas aos poderes constituídos, com mais freqüência será vista a interpretação constitucional operada pelos tribunais.
As Constituições atuais, estruturadas fundamentalmente como um conjunto de regras e princípios, deixam largo espaço para a atividade concretizadora efetuada pelos Tribunais Constitucionais que passaram na sua ação cotidiana a incorporar elementos valorativos e da realidade fática na determinação do conteúdo e do alcance das normas constitucionais, sempre em busca da maior efetividade dos preceitos constitucionais.
Nesse sentido a questão fundamental paira em torno da legitimidade da jurisdição constitucional, onde se indaga se os Tribunais teriam legitimidade democrática para invalidar leis e atos emanados pelo Congresso, ou para transformarem de modo inovador, o sentido, significado e alcance das normas constitucionais.
Acerca do tema existem basicamente duas correntes. A primeira corrente, a qual se filia Alexandre Bickel, entende que a jurisdição constitucional apresenta uma feição antidemocrática, pois é exercida por um órgão não eleito pela vontade popular, gerando um acomodamento do Poder Legislativo na sua função de produzir normas constitucionais.
A segunda corrente entende que a jurisdição constitucional é plenamente legítima, que tal legitimidade não se origina de votação popular, mas sim de outras fontes, neste sentido posiciona-se Alexandre de Moraes (2003, A., p.68).
A doutrina apresenta três sustentáculos para a aceitação de tal legitimidade, a saber: complementariedade entre democracia e estado de direito, composição dos tribunais constitucionais e fundamentação e aceitação popular das decisões dos tribunais.
Predomina hodiernamente o entendimento de que a interpretação judicial passou a ser a forma mais importante de interpretação constitucional orgânica. Cada vez mais a interpretação constitucional judicial tem assumido a condição de relevante mecanismo de mutação constitucional, por meio das mutações desenvolvidas pelos tribunais é possível a transformação do significado é alcance das normas constitucionais, gerando de forma evolutiva a adaptação da Constituição ao momento presente, acompanhando deste modo a realidade social.
Realizadas as considerações acerca da interpretação constitucional orgânica, passaremos a fazer considerações acerca da importância da interpretação constitucional inorgânica.
Conforme entendimentos de Peter Härbele (1997, p.14), A interpretação constitucional sempre foi visualizada como uma atividade fechada na qual participavam apenas intérpretes jurídicos vinculados a corporações e aqueles participantes formais do processo constitucional, no entanto, não deve ser vista como uma atividade fechada, eis que todas as potências públicas, participantes do processo social, estão nela envolvidas, sendo ela, a um só tempo, elemento resultante da sociedade aberta e um elemento formador ou constituinte dessa sociedade. Sustenta o autor que os órgãos estatais, o sistema público, os grupos de pressão, a opinião pública e os cidadãos em geral também são intérpretes constitucionais atuando nitidamente como pré-intérpretes.
A doutrina cita como exemplo desta norma pluralística a figura do amicus curiae, conceituado como o terceiro interessado que pode prestar informações e trazer elementos de convencimento ao Supremo Tribunal Federal acerca de uma dada controvérsia, podendo influir em sua decisão.
Desta forma, entende-se que a interpretação constitucional inorgânica também atua como elemento de mutação constitucional, mesmo que de forma indireta.

3.3 – Mutações pelos costumes constitucionais

Conforme entende a doutrina italiana as fontes do direito são divididas em atos normativos (procedimento de formação estabelecido de forma objetiva, exemplo: leis) e fatos normativos (procedimento de criação não é claramente preestabelecido), estando ambos aptos a produzirem normas jurídicas. Dentre as diversas características dos costumes jurídicos podemos apontar: eficácia jurídica, primariedade, caráter não escrito, formação voluntária (KUBLISCKAS, 2009, p.135).
Dentro da perspectiva supra os costumes jurídicos e por óbvio, os constitucionais, se enquadrariam dentro da espécie fatos normativos.
Como precisa Wellington Márcio Kubliskcas o costume constitucional, pode ser definido como um uso ou convenção constitucional tido como obrigatório pela comunidade em geral e que é empregado pelos órgãos constitucionais competentes no preenchimento de lacunas ou na interpretação de normas constitucionais obscuras, sempre em conformidade com as normas constitucionais escritas.
A doutrina em geral identifica dois elementos básicos que compõem o conceito de costume constitucional, a saber: elemento objetivo (usus ou consuetudo) e elemento subjetivo (opinio necessitatis).
O usus ou consuetudo, ou seja, a prática reiterada de uma conduta, para ser considerado elemento objeto de costume deve ser uniforme, constante, pública e geral, de forma a assegurar estabilidade e permanência à sociedade, não existe prazo para se afirmar que um costume jurídico foi aceito pela sociedade.
A opinio necessitatis é uma convicção baseada na aceitação tácita da sociedade, sendo considerada uma regra obrigatória, é fundamental distinguir o costume jurídico de outros tipos de costumes, como o religioso, social, moral, etc. que podem até resultar em conseqüências jurídicas, contudo não constituem normas de Direito.
Deste modo, o costume constitucional para ser considerado como fonte de norma jurídica costumeira, deve necessariamente apresentar a união dos elementos objetivo (usus ou consuetudo) e subjetivo (opinio necessitati) (BULOS, 1997, p.189).
Os costumes constitucionais apresentam algumas peculiaridades, dentre as quais se destacam (KUBLISCKAS, 2009, p.139/141):
Inferioridade com relação às normas constitucionais escritas (não adquirem plenamente a eficácia das normas constitucionais escritas, as normas costumeiras não reformam ou revogam as normas constitucionais escritas); Relação peculiar com as normas infraconstitucionais (dependendo da situação podem revogar as normas infraconstitucionais, quando a norma intervém em campo que lhe é vedado ou podem ser afastados pelas mesmas, quando o meio apto para complementar a Constituição é a norma infraconstitucional e o costume supriu temporariamente a sua ausência); Origem do costume nos órgãos de poder (não se originam na comunidade geral e sim nos órgãos constitucionalmente competentes para atuar a constituição); Espontaneidade e voluntariedade (manifestação livre dos órgãos competentes para atuar a constituição); Decurso de tempo menor que o costume em geral.
Os costumes constitucionais podem ser de três tipos: secundum constitutionem (corrige imperfeições e obscuridades); praeter constittutionem (preenche lacunas constitucionais, cita-se como exemplo, no Brasil, o descumprimento pelo executivo de normas que este considere inconstitucional) e contra constitutionem (praticas e comportamentos contrários a Constituição, a doutrina é pacifica ao negar validade a este tipo de costume).
De tudo que foi exposto, pode-se depreender que os costumes constitucionais são instrumentos aptos a produzir, dentro de certos limites, mudanças no sentido, significado e alcance das normas constitucionais, caracterizando mutações constitucionais.




Capítulo IV – INCIDÊNCIAS DAS MUTAÇÕES CONSTITUCIONAIS NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO

O primeiro pressuposto a ser considerado para incidência do fenômeno mutação constitucional em um dado país é o grau de abertura da sua constituição, são considerados, em linhas gerais, documentos abertos aqueles que aceitam como válidos outros conteúdos além daqueles expressamente contidos em seu texto, como por exemplo: direito internacional (conteúdo normativo externo); usos e costumes (conteúdos extranormativos); postulados morais e questões socioeconômicas (conteúdos meta-normativos), etc. Também deve ser considerado o grau de abstração de alguns preceitos normativos, fato que confere ao intérprete da norma alto grau de discricionariedade.
A constituição da República Federativa do Brasil de 1988 reúne todas as características mencionadas no parágrafo anterior, podendo ser classificada como uma Constituição aberta.
A abertura da CRFB/88 é decorrente de alguns fatores, dentre eles podemos citar: a interação entre a ordem interna e a ordem internacional, vislumbrada através do seu art.5º, §2º, que prevê “os direitos e garantias expressos na Carta não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”, depreende-se da leitura que o regime constitucional brasileiro é receptivo a ordenamentos jurídicos estrangeiros.
Pode-se afirmar que as normas editadas pelos organismos internacionais exercem forte influência quando da interpretação e aplicação das normas constitucionais.
No campo interno, não obstante possua um texto prolixo e detalhista, a CRFB/88 atribuiu importância ímpar aos princípios constitucionais, que apresentam um alto grau de abstração, o legislador positivou dois superprincípios constitucionais, a saber: o Principio do Estado democrático de Direito (art.1º, II, V e parágrafo único) e o Principio da Dignidade da pessoa humana (art.1º, II, III e IV), tal nomenclatura adotada para os aludidos princípios é justificada com base no regime jurídico implementado no Brasil pós-88 à medida que os mesmos se projetam sobre as outras normas.
O princípio do Estado Democrático de Direito veicula a idéia de que o Brasil não é um Estado de polícia, autoritário e contrário aos direitos e garantias fundamentais, mas sim um Estado democrático de Direito, que assegura Direitos inalienáveis.
O princípio da Dignidade da pessoa humana é entendido como o mínimo invulnerável que todo estatuto deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais (BULOS, 2007, p.389).
Os superprincípios são normas constitucionais dotadas de importância nuclear no sistema, fato que pode ser comprovado pela freqüência com que são utilizados na interpretação das demais normas constitucionais; eles apresentam um alto grau de abstração e flexibilidade, podendo ser chamados para reger a defesa de interesses contrapostos e ter seu conteúdo alterado com base no contexto social.
Além de superprincípios a CRFB/88 também positivou os denominados princípios fundamentais, que definem e caracterizam a coletividade política e o Estado, assim como enumera as principais opções político-constitucionais, dentre eles pode-se destacar: os princípios relativos à existência, forma, estrutura e tipo de Estado (art.1º); os princípios relativos à forma de governo e à organização dos poderes (art.1º e 2º); os princípios relativos à organização da sociedade (art.3º, I); etc.
É importante salientar que embora os princípios fundamentais apresentem maior densidade semântica que os superprincípios constitucionais, também são dotados de maleabilidade e flexibilidade, sofrendo de mesma forma impacto das condições fáticas e do contexto socioeconômico e político quando da sua aplicação.
Os princípios constitucionais gerais derivam dos princípios fundamentais e consubstanciam-se basicamente no princípio da igualdade (art.5º, I), da legalidade (art.5º, II), da liberdade individual (art.5º, IV, IX, XIII e XV), da função social da propriedade (art.5º, XXIII), os princípios-garantia (art.5º, XXXVIII a LX), da administração pública (art.37, caput), etc.
Existem também os princípios constitucionais especiais, relacionados a situações ou setores específicos, dotados de um caráter menos abstrato, aproximando-se às regras constitucionais, dentre eles podemos destacar o da vitaliciedade dos magistrados (art. 95, I,).
Conforme sintetiza J.J. Gomes Canotilho, os princípios constitucionais possuem interdependência e devem estar em constante interação, devendo os mais genéricos ser densificados pelos menos genéricos, estando abertos à constante evolução, formando um sistema coerente e coeso.
Exemplificando, tem-se que o princípio do Estado Democrático de Direito (superprincípio), é densificado por inúmeros subprincípios (como o da legalidade), que por sua vez é densificado por outros princípios constitucionais (como o da reserva legal).
Contudo, ainda que existam parâmetros dentro dos quais os intérpretes/aplicadores possam atuar, a definição concreta de Estado Democrático de Direito, Dignidade da pessoa humana, pode ser alterada em virtude das condições fáticas e dos valores da sociedade em um dado momento, ou seja, dependendo do contexto sociopolítico e econômico em que eles forem aplicados, o conteúdo de tais princípios pode variar sem alterar uma letra sequer da Constituição, ocasionando mutação constitucional no ordenamento jurídico brasileiro.
A CRFB/88 é repleta de cláusulas gerais ou conceitos jurídicos indeterminados, dentre eles cabe apontar: razoável duração do processo (art.5º, LXXVIII) e ordem pública (art.34, III), nestes casos o intérprete precisará exercer uma valoração na realidade fática para definir o alcance da norma quando da aplicação concreta.
De tudo que foi exposto, pode-se concluir que a CRFB/88 admite uma constante interação entre a ordem normativa e a realidade circundante, entre as normas constitucionais e os valores predominantes na sociedade em determinado momento, quer seja pelo método formal (revisão e emenda), quer seja pelo método informal (mutação constitucional).

4.1 Exemplos na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988

A conjugação de uma estrutura aberta com o fortalecimento do STF como agente responsável pela concretização das normas constitucionais, tornou a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 um solo fértil para a incidência de mutações constitucionais.
Através de exemplos práticos extraídos da jurisprudência do STF tentaremos demonstrar como o fenômeno da mutação constitucional tem incidido sobre a CRFB/88.
Para tal demonstração, foram selecionados alguns casos concretos, em que o guardião de nossa Lei maior, no exercício jurisdição constitucional, introduziu alteração no significado ou alcance de determinadas normas constitucionais, sem vulnerar-lhes seu espírito:
MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL NO ART.5º, LXVII, CRFB/88 (DESCABIMENTO DA PRISÃO CIVIL DO DEPOSITÁRIO INFIEL).
De acordo com entendimento do guardião de nossa lei maior, STF, não é possível que ocorra no sistema constitucional vigente no Brasil a decretação de prisão civil do depositário infiel.
Neste sentido posicionou-se o Ministro Celso de Mello em “habeas corpus”, com pedido de medida liminar, impetrado contra decisão emanada de eminente Ministro do E. Superior Tribunal de Justiça, que, em sede de idêntico processo (HC nº 108.025/SP), negou seguimento ao “writ” constitucional deduzido perante aquela Alta Corte (fls. 46/47), mantendo a decisão denegatória proferida pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo nos autos do HC nº 7.211.878-6 (fls. 43/44).
O eminente o Ministro Celso de Mello entendeu que a decisão judicial de primeira instância, mantida pelo E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e pelo E. Superior Tribunal de Justiça, não poderiam prevalecer, eis que estaria frontalmente contrária à Convenção Americana sobre Direitos Humanos, ao Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e à Constituição da República, considerada, no ponto, a jurisprudência que o Supremo Tribunal Federal havia firmado na matéria em causa, no sentido de que não mais subsistiria, em nosso ordenamento positivo, a prisão civil do depositário infiel, inclusive a do depositário judicial.
O aludido Ministro colacionou em seu voto algumas jurisprudências, dentre as quais destacamos: “A INTERPRETAÇÃO JUDICIAL COMO INSTRUMENTO DE MUTAÇÃO INFORMAL DA CONSTITUIÇÃO. A questão dos processos informais de mutação constitucional e o papel do Poder Judiciário: a interpretação judicial como instrumento juridicamente idôneo de mudança informal da Constituição. A legitimidade da adequação, mediante interpretação do Poder Judiciário, da própria Constituição da República, se e quando imperioso compatibilizá-la, mediante exegese atualizadora, com as novas exigências, necessidades e transformações resultantes dos processos sociais, econômicos e políticos que caracterizam, em seus múltiplos e complexos aspectos, a sociedade contemporânea”.
No julgamento mencionado, o Supremo Tribunal Federal, ao assim decidir, teve presente o que dispõem, na matéria, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos/Pacto de São José da Costa Rica (Artigo 7º, § 7º) e o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (Artigo 11).
Verificamos através do exposto que ocorreu verdadeira mutação constitucional, no art.5º, LXVII, de nossa Lei maior, eis que o texto expresso não coaduna com a realidade fática, ou seja, hodiernamente não é mais cabível a prisão civil do depositário infiel.
MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL NO ART.5º, CAPUT, CRFB/88 (AMPLITUDE DA PROTEÇÃO, ASSEGURANDO OS DIREITOS ALI PREVISTOS AOS ESTRANGEIROS EM TRÂNSITO NO BRASIL).
O guardião de nossa Constituição, STF, ao julgar o Habeas Corpus nº. 74.051-3/SC, cuja relatoria do processo ficou a cargo do Ministro Marco Aurélio de Mello, entendeu que ocorreu mutação constitucional da norma prevista no art. 5º, caput. O caso concreto refere-se ao pedido de Habeas Corpus, cujo paciente era um estrangeiro que não possuía residência em nosso país.
Na referida ação, o autor alegava excesso de prazo no cumprimento de prisão preventiva. Cabe observar que o Habeas Corpus é uma ação constitucional cuja finalidade é preservar a liberdade de locomoção (art. 5º, LXVIII, CRFB/88), ou seja, se fosse interpretado literalmente o art.5º, caput, CRFB/88, no que tange aos destinatários dos direitos e garantias individuais, teríamos como conseqüência a impossibilidade de impetração da aludida ação pelos estrangeiros que não possuíssem residência no Brasil.
No artigo art.5º, caput, CRFB/88, está expresso que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. Através da leitura do referido diploma evidencia-se que a Constituição tem expressamente como destinatários de proteção apenas os brasileiros e os estrangeiros residentes no país.
Através da interpretação conferida pelo STF, pode se afirmar que não só os estrangeiros residentes, mas também os em trânsito tem assegurado os direitos previstos no aludido diploma, se assim não o fosse, os estrangeiros que se encontrassem em trânsito estariam impedidos de reivindicar a proteção aos direitos e garantias individuais expressos no art. 5º, caput, da carta constitucional, o que não coadunaria com os princípios fundamentais da República Federativa do Brasil, especialmente com o superprincípio da dignidade da pessoa humana, que serve para nortear a aplicação da justiça social.
Ante ao exposto, pode-se afirmar que ocorreu verdadeira mutação constitucional no art.º5º, caput, da nossa Lei maior.
MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL NO ART.5º, XI, CRFB/88 (ABRANGENCIA DO TERMO CASA).
O art. 5º, XI, CRFB/88 determina que “a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial.”
Visando assegurar a efetividade do direito à inviolabilidade do domicílio o STF conferiu através do julgamento do RE n.º251.445/GO uma interpretação ampliativa ao termo “casa”, dispondo que o conceito casa a que se refere o art.5º, XI, da Lei Fundamental, reveste-se de caráter amplo, eis que compreende, para efeitos de proteção, qualquer compartimento habitado; qualquer aposento ocupado de habitação coletiva e qualquer compartimento privado onde alguém exerce profissão ou atividade, se estendendo tal conceito aos consultórios profissionais, dos cirurgiões-dentistas.
Conforme enfatiza Uadi Lammêgo Bulos, ao atribuir sentido amplo ao signo ‘casa’, o ato interpretativo ensejou mutação constitucional no inciso XI do art.5º da Carta de 1988 (2007, P.320).
MUTAÇÃO CONSTITUCIONAL NO ART.52, X, CRFB/88 (COMPETÊNCIA DO SENADO FEDERAL PARA EDIÇÃO OU PUBLICAÇÃO DE NORMA DECLARADA INCONSTITUCIONAL ATRAVÉS DE CONTROLE DIFUSO?)

No ano de 2007, chegou ao STF um caso que abordava de maneira transparente o fenômeno da mutação constitucional, tratava-se da Reclamação n.º4.335-5/AC, que se pautava no descumprimento por parte do juiz de Direito da Comarca de Rio Branco/AC de decisão do STF proferida nos autos do HC n.º82.959/SP (controle difuso, onde a corte determinou a exclusão da vedação da progressão de regime aos condenados por crimes hediondos por considerar inconstitucional o art.2º, da Lei n.º8.072/90), já que o magistrado da causa denegou a progressão de regime para alguns condenados que haviam cometido crime hediondo, não observando a decisão da Corte Suprema.
Estar-se-á diante de um aumento no âmbito de abrangência do que foi decretado incidentalmente pelo STF. Logo, a decisão proferida produzirá efeitos para todos, a partir do momento que vier a ser publicada, gerando efeitos não retroativos. Esse procedimento resulta da chamada Resolução do Senado Federal.
Ocorre que, o Senado Federal, conforme o disposto na CRFB/88 tem competência para edição da norma (resolução) para suspender a execução de lei tida como inconstitucional, no entanto não está obrigado a fazê-lo, surge assim um impasse.
Os votos dos Ministros na aludida reclamação suscitaram um amplo debate acerta da ocorrência ou inocorrência de mutação constitucional sobre o art. 52, X, CRFB/88, que dispõe “compete privativamente ao Senado Federal [...] suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal”.
Duas posições se formaram no caso concreto, a primeira delas representada pelos Ministros Gilmar Mendes e Eros Grau, sustenta que ocorreu mutação constitucional no referido artigo, tendo sido alterada a competência do Senado que passou a ter prerrogativa de dar apenas publicidade às decisões. A segunda, representada pelos Ministros Sepúlveda Pertence e Joaquim Barbosa, defendem que deveria ser mantida a interpretação tradicional, eis que não estariam presentes o decurso do tempo e o desuso definitivo do dispositivo.
Existem várias críticas concernentes ao primeiro posicionamento, dentre elas destaca-se a qual preconiza que no controle difuso de constitucionalidade, a participação democrática da sociedade ocorreria de forma indireta, por meio mesmo da participação política do Senado Federal na suspensão da execução da lei declarada inconstitucional – art. 52, inciso X, da Constituição Federal, logo, ao se excluir, ou mesmo diminuir, a função do Senado no controle de constitucionalidade importaria retirar do controle difuso a legitimidade democrática.
Até a presente data a aludida reclamação não foi julgada.

4.2 O Supremo Tribunal Federal e as Mutações Constitucionais

Contribuiu de forma decisiva para o aumento da incidência do fenômeno da mutação constitucional no Brasil após 1988 o fortalecimento da jurisdição constitucional, em especial a exercida pelo STF, principal personagem na consolidação e desenvolvimento da CRFB/88.
O STF foi instituído pelos Decretos nº510, de 22 de junho de 1890, e n.º848, de 11 de outubro de 1890.
O órgão foi inserido pela primeira vez como matéria constitucional através dos arts.55 a 59 da Constituição Federal de 1891, basicamente com as mesmas funções previstas através dos Decretos supramencionados. Na vigência da referida Constituição, foi editada a Lei Federal n.º221/1894, a qual atribuiu expressamente à justiça Federal, mormente ao STF, o poder de deixar de aplicar leis e atos normativos contrários à Constituição Federal, concedendo flagrantemente ao STF a competência para o exercício da jurisdição constitucional, que é entendida por Wellington Márcio Kublisckas como

O controle de constitucionalidade das leis e demais atos normativos, representado pelo poder de negar a execução de lei considerada inconstitucional, em concorrência com as demais instâncias do Poder Judiciário (controle difuso); a tutela das liberdades públicas, através do instituto do habeas corpus; e a jurisdição constitucional sem controle de constitucionalidade, representada pela competência para processar e julgar autoridades públicas e para solucionar conflitos entre os Poderes e entre os entes da Federação (2009, p.242).


Nas Constituições posteriores o quadro de competências do STF foi fortemente ampliado. A Constituição Federal de 1934 alterou a denominação do tribunal para Corte Suprema e trouxe inovações significativas atinentes à jurisdição constitucional, dentre as quais merece destaque: a instituição do mandado de segurança para a defesa de Direito líquido e incontestável contra atos manifestamente ilegais do Presidente da República ou de Ministro de Estado.
A Carta de 1937, não inovou significativamente as competências do STF, o período foi marcado pela submissão do órgão aos interesses do Executivo.
A Constituição de 1946 retomou a verdadeira função de jurisdição constitucional exercida pelo STF. Na vigência desta Constituição foi editada a Emenda Constitucional n.º 16/65, criando a denominada representação por inconstitucionalidade, que era manejada exclusivamente pelo Procurador-Geral da República.
As Constituições de 1967 a 1969 mantiveram a mesma estrutura no tocante à jurisdição constitucional, no entanto em função da restrição às garantias da magistratura (decretação da aposentadoria compulsória de alguns Ministros que se opunham ao regime) bem como da exclusão do controle jurisdicional dos Atos Institucionais (AIS), o STF não manifestou resistência às violações de alguns direitos fundamentais ocorridas no período.
Finalmente, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, editada durante o processo de redemocratização do país, promoveu inovações significativas, conferiu ao STF em matéria de jurisdição constitucional o papel de Guardião da Constituição.
Como guardião da Constituição o STF tem prerrogativa para reelaborar o significado do texto constitucional, permitindo que a Constituição se ajuste às novas circunstâncias históricas e exigências sociais, dando-lhe, com isso, um sentido de permanente e necessária atualidade, função plenamente compatível com o exercício da jurisdição constitucional.
A conjugação do caráter aberto e abstrato da CRFB/88 e o fortalecimento do STF como agente concretizador do texto da Constituição refletem a importância do fenômeno mutação constitucional no Brasil após o ano de 1988.

4.3 Mutações Inconstitucionais

A interpretação constitucional é inegavelmente um instrumento importante e eficiente para adaptar as normas constitucionais às necessidades emergentes do cotidiano.
No entanto se ocorrer quebra de juridicidade dos princípios informadores da ordem constituída, neste caso estaremos diante de mutações inconstitucionais. Conforme preconiza Uadi Lammêgo Bulos

As mutações inconstitucionais destroem a vida dos preceptivos constitucionais, idealizados por obra de um poder incondicionado, cujo reflexo incide sobre todo o ordenamento jurídico. Os efeitos provocados por estas deformações variam em grau e em profundidade e podem contrariar a Carta Suprema, em maior ou menor extensão, sem mudar a letra de suas normas (1997, p.135).

A mutação constitucional é admitida no ordenamento jurídico brasileiro, no entanto dela não pode advir deformação no sentido e significado dos direitos estampados no texto constitucional, caso advenha, haverá ruptura no Estado Democrático de Direito (baseado na convivência harmônica das liberdades públicas e nos relevantes interesses públicos que regem o Estado), configurando deste modo mutação inconstitucional, que é contrária ao espírito humanista que anima o nosso Estado de Direito.
Como exemplo ilustrativo de mutação inconstitucional, podemos citar a investidura do Marechal Floriano Peixoto, então vice-presidente, na Presidência da República, fato que violou o art.42 da Constituição de 1891, que previa “no caso da vaga por qualquer causa, da presidência ou Vice-Presidência, se não houverem ainda decorridos dois anos do período presidencial, proceder-se-á nova eleição”. Desprezando este artigo o Congresso Nacional permitiu que o Vice-Presidente assumisse a chefia do executivo, embora a renúncia do primeiro Presidente tenha ocorrido antes de dois anos.
As violações ao espírito constitucional derivam de interpretações maliciosas e podem gerar mudanças eventuais ou permanentes, e, até mesmo suspender por algum tempo os efeitos das normas constitucionais.
A doutrina adota as expressões falseamento da Constituição ou quebramento constitucional para nominar qualquer alteração que não esteja expressamente prevista no texto constitucional (procedimento).
Há quem sustente que haverá falseamento autêntico, nos casos de violação das normas constitucionais, que configura vício de inconstitucionalidade.
Em sentido amplo, as nomenclaturas falseamento e quebramento constitucional podem significar espécies do gênero mutação inconstitucional, desde que ao realizarem modificação na interpretação do texto, expressem o entendimento contrário à forma determinada pelo legislador constituinte.
Bulos (1997, p.138) determina que numa acepção estrita, os institutos mencionados no parágrafo anterior jamais deverão ser confundidos com as mudanças operadas em sentido contrário ao texto constitucional, pois podem existir mutações inconstitucionais sem falseamento ou quebramento e vice-versa.
São incontestáveis os riscos oriundos da interpretação constitucional (processo informal de mudança da constituição), podendo ao adaptar a Lei Maior à realidade social, desvirtuar a norma, comprometendo a estabilidade jurídica, caracterizando mutação inconstitucional.
Por tal motivo há de se haver controle a fim de evitar uma defeituosa interpretação, devendo ser a mesma extirpada do ordenamento jurídico, caso ocorra.
Deve ocorrer sobre essas mutações inconstitucionais o controle advindo da opinião pública, dos partidos políticos ou de outros grupos de pressão.
Bulos (1997, p.139) define como medidas preventivas de mutações inconstitucionais, o fortalecimento do controle jurisprudencial e a instituição de novos instrumentos de controle popular.
De tudo que foi exposto, pode-se afirmar que os riscos existem, contudo não devem ser encarados como pretexto para a não interpretação das normas constitucionais.
As mutações, quando constitucionais, promovem mudanças necessárias e admitidas na Constituição, considerando em todo momento o pensamento social, inexistindo desta forma, a necessidade de buscar socorro nos processos formais de alteração, emanados de reformas, que em alguns momentos são despropositadas.













CONCLUSÃO

Foi feita inicialmente uma abordagem acerca do conceito de constituição, pudemos constatar que hodiernamente a Constituição é conceituada como o documento supremo do Estado, onde estão inseridas normas referentes à estruturação do mesmo, à formação dos poderes públicos, a forma de governo e aquisição do poder, a distribuição de competências, direitos, garantias e deveres dos cidadãos; que a Constituição individualiza os órgãos competentes para a edição de normas jurídicas, legislativas e administrativas.
Visualizamos que a Constituição possui três sentidos: político, jurídico e sociológico, que este último tem grande relevância para a ocorrência do fenômeno mutação constitucional, já que visa igualar a realidade social à norma constitucional. Ainda, que a Constituição da República Federativa do Brasil é classificada como formal, escrita, legal, dogmática, promulgada, rígida e analítica.
A Constituição brasileira foi instituída através de um Poder Constituinte, que é conceituado como poder de produção das normas constitucionais, por meio do processo de elaboração e/ou reforma da constituição, com o fim de atribuir legitimidade ao ordenamento jurídico do Estado.
O Poder Constituinte é dividido pacificamente pela doutrina em originário (características: inicial, ilimitado e incondicionado, exemplo: Constituição da República Federativa do Brasil de 1988) e derivado (características: subordinado, limitado e condicionado a CRFB/88), este por sua vez se subdivide em derivado decorrente (manifesta-se através das Constituições estaduais) e em derivado reformador (manifesta-se através de revisões e emendas).
É cabível apontar que para Anna Cândida da Cunha Ferraz o Poder Constituinte seria dividido em decorrente, reformador e difuso, sendo esta última espécie representada pelas mutações constitucionais; acreditamos que a tendência é que a divisão proposta pela autora, em pouco tempo, seja reconhecida majoritariamente.
O Poder Constituinte derivado sofre limitações, estão previstas em nossa lei maior e se subdividem em: circunstanciais (art.60, § 1º, CRFB/88), materiais (art.60, §4º, CRFB/88 “cláusulas pétreas”), procedimentais ou formais (art.60, I, II, II, §§ 2º, 3º e 5º, CRFB/88, relativas ao processo legislativo) e temporais (art.3º, ADCT).
No Brasil a regra é a utilização do controle de constitucionalidade judiciário, porém temos também o controle feito pelo executivo e pelo legislativo, todos têm por escopo verificar a compatibilidade de atos normativos com a constituição, temos o controle preventivo (impede o ingresso no ordenamento jurídico de normas eivadas pela inconstitucionalidade/ comissões de constituição e justiça e o veto jurídico) e o repressivo (expurga do sistema a norma editada em desrespeito a Constituição) que é misto, ou seja, realizado de forma concentrada pelo STF e difusa pelos tribunais.
Pudemos visualizar na CRFB/88 cinco espécies pertencentes ao gênero controle concentrado, a saber: Ação direta de inconstitucionalidade genérica (art.102, I, a); Ação direta de inconstitucionalidade interventiva (art.36, III); Ação direta de inconstitucionalidade por omissão (art.103§2º); Ação declaratória de constitucionalidade (art.102, I, a); Arguição de descumprimento de preceito fundamental (art.102,§1º).
O fenômeno mutação constitucional foi visualizado inicialmente pelos autores tedescos do final do século XIX, a definição que achamos mais acertada, considerando a evolução do conceito, é a de que mutação constitucional é o fenômeno por meio do qual, sem emendas ou revisões (processos formais de mudança da Constituição), são introduzidas, no processo de concretização/aplicação, por meio de interpretação constitucional e/ou da integração pelos costumes, alterações no sentido, significado ou alcance de determinadas normas constitucionais (que tenham o conteúdo minimamente aberto/elástico), desde que estas alterações sejam comportadas pelo programa normativo, ou seja, promova o desenvolvimento, complementação, estabelecimento etc., das normas constitucionais escritas, mas não violem o seu espírito.
Suprimimos do conceito proposto por Wellington Márcio Kublickas, à parte em que o mesmo condiciona a mutação constitucional à incolumidade do texto, eis que recentemente foi alterado através de mutação constitucional por interpretação o art.5º, LXVII, CRFB/88, que tem expressamente o cabimento da prisão civil por dívida do depositário infiel, no entanto, frontalmente contrário à norma está o posicionamento do STF pelo descabimento da referida prisão.
As mutações constitucionais apresentam as seguintes características: Informalidade; Pluralidade de agentes; Distanciamento no tempo; Manutenção do texto/modificação da norma (não é absoluta); Sujeição a limites; Abertura/elasticidade constitucional, dentre outras.
A abertura/elasticidade das normas constitucionais deve ser observada sobre os seguintes aspectos: caráter principiológico das normas constitucionais; frequência relativa à necessidade de harmonização das normas constitucionais; existência de normas constitucionais de eficácia limitada e lacunas das normas constitucionais.
Com relação aos limites das mutações constitucionais podemos afirmar que a mutação será considerada constitucional quando o ato do qual se originar não contrariar de modo evidente o espírito da constituição, estiver devidamente fundamentado nos preceitos constitucionais interpretados, for racional e legitimamente aceito pela comunidade jurídica, não podendo subverter o conteúdo das normas.
As mutações constitucionais devem respeitar limites objetivos (não contrariar o espírito da constituição) e subjetivos (agir em conjunto com o corpo sócio-politico).
Fizemos algumas considerações acerca de interpretação constitucional, donde pudemos depreender que a função primordial da interpretação constitucional é a de criar condições para a aplicação da norma Constitucional a um determinado caso concreto.
Foram abordados alguns princípios relativos à interpretação constitucional, cumpre destacar: Princípio da unidade da Constituição; Princípio da concordância prática ou da harmonização; Princípio da força normativa da Constituição; Princípio do efeito integrador; Princípio da justeza ou da conformidade funcional. Além de princípios a interpretação constitucional conta com métodos próprios divididos em tradicionais e modernos, este último se subdivide em método científico-espiritual (busca o sentido e realidade de uma norma constitucional, seu espírito), achamos muito interessante; Método tópico-problemático (o problema passa a ser considerado o eixo central da atividade interpretativa, este método foi alvo de inúmeras críticas); Método normativo-estruturante (a norma constitucional não seria apenas o ponto de partida, mas o resultado da concretização na medida em que não estaria inserida no texto e nem antecederia ao trabalho do operador do direito); Método hermenêutico-concretizador (Preconiza que a interpretação constitucional não é um procedimento de submissão, mas de concretização, eis que apresenta um caráter criador do conteúdo da norma interpretada, coaduna realidade e norma, entendemos ser este método o mais preciso).
Embora exista divergência doutrinária acerca da classificação das mutações constitucionais, entende-se que o fenômeno se divide em mutação constitucional por interpretação e mutação constitucional pelos costumes.
Mutação constitucional por interpretação - A doutrina moderna entende que a interpretação, não pode ser vista apenas como processo reprodutivo da vontade de outrem, mas como processo produtivo e criador de sentido, não estando, porém o intérprete autorizado a desvincular-se totalmente da norma, mas apenas conferindo a este a possibilidade de atuar dentro dos limites da discricionariedade, quando a norma estiver obscura ou polissêmica, adotando por via de conseqüência decisões inovadoras – a doutrina distingue interpretação orgânica da inorgânica, a primeira é realizada pelo executivo, legislativo e judiciário, ocorrendo com maior frequência neste último, a segunda é realizada pela sociedade num todo, através da influência e pressão exercidas sob os interpretes orgânicos.
Mutação constitucional pelos costumes - O costume é tido como obrigatório pela comunidade em geral, sendo empregado pelos órgãos constitucionais competentes no preenchimento de lacunas e na interpretação de normas constitucionais obscuras, sempre em conformidade com as normas constitucionais escritas, constituindo desta forma, espécie do gênero mutação constitucional.
De tudo que foi visto, pode-se afirmar que a CRFB/88 admite uma constante interação entre a ordem normativa e a realidade circundante, entre as normas constitucionais e os valores predominantes na sociedade em determinado momento, quer seja pelo método formal (revisão e emenda), quer seja pelo método informal (mutação constitucional).
Demonstrou-se através do presente trabalho a incidência de mutações constitucionais nas seguintes normas da Constituição brasileira de 1988: art.5º, LXVII, CRFB/88 (descabimento da prisão civil do depositário infiel); art.5º, caput, CRFB/88 (amplitude da proteção, assegurando os direitos ali previstos aos estrangeiros em trânsito no Brasil); art.5º, XI, CRFB/88 (abrangência do termo casa); art.52, X, CRFB/88 (competência do senado federal para edição ou publicação de norma declarada inconstitucional através de controle difuso.)
Após a CRFB/88 ocorreu o fortalecimento da jurisdição constitucional, o que contribuiu muito para o aumento das mutações constitucionais realizadas pelo STF, sendo o guardião da Constituição, tem prerrogativa para reelaborar o significado do texto constitucional, permitindo que a mesma se ajuste às novas circunstâncias históricas e exigências sociais.
Deste trabalho depreende-se que as mutações constitucionais são meios necessários de reforma ao texto constitucional, no entanto entendemos que tais reformas operadas através de mutações não devem advir de deformação no sentido e significado dos direitos estampados no texto constitucional, caso advenha, haverá ruptura no Estado Democrático de Direito (baseado na convivência harmônica das liberdades públicas e nos relevantes interesses públicos que regem o Estado), configurando deste modo mutação inconstitucional, que é totalmente contrária ao espírito humanista que anima o nosso Estado de Direito.






















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Monografia Graziela da Silva Cruz.